Foto: Neto Figueiredo/Secom RR.

Consideradas como ferramenta de transparência e de segurança nas ações policiais, a adoção de câmeras corporais pela Polícia Militar de Roraima (PMRR) pouco avançou desde o início do programa piloto feito pela corporação e iniciado em abril deste ano. Com 40 câmeras em operação disponíveis para os policiais do Estado, ainda não há uma previsão para que as câmeras sejam disponibilizadas para a maioria do efetivo do Estado.

O Governo de Roraima informou que já têm câmeras disponíveis em batalhões e unidades das forças policiais, mas que ainda precisa realizar treinamentos e ajustes operacionais para garantir o uso em conformidade com a legislação. A previsão inicial era de que após o programa piloto, as câmeras fossem entregues para as Forças de Segurança até o ano que vem. Ainda não há previsão para que a fase de testes seja concluída.

As Forças de Segurança de Roraima receberam, em abril, câmeras para acoplar nos uniformes. O investimento do Governo do Estado somou mais de R$ 6 milhões. A Polícia Militar recebeu cinco kits de câmeras, totalizando 40 câmeras; o Departamento Estadual de Trânsito (Detran), 68 câmeras; o Corpo de Bombeiro Militar, a Secretaria de Segurança Pública e a Polícia Civil receberam um kit cada, totalizando oito câmeras para cada instituição.

O uso de câmeras corporais é um projeto-piloto no Estado. Estudos indicam que as câmeras reduzem a resistência de pessoas que estão sendo presas, detidas ou abordadas e dão mais transparência e fidelidade às operações e ações policiais, segundo o governo de Roraima.

“É uma nova tecnologia que vai dar mais segurança à sociedade e também aos agentes de segurança pública. É a vanguarda da segurança pública, e Roraima está se associando aos grandes Estados da Federação, que já fazem uso das câmeras corporais”, destacou o secretário de Segurança Pública, coronel Edison Prola.

De acordo com dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) em julho deste ano, Roraima teve um policial militar morto durante atividade policial, em 2022, contra nenhum no ano anterior. Ainda de acordo com o estudo, em 2022, 10 pessoas morreram em decorrência de intervenções de policiais militares em serviço no Estado, contra oito em 2021.

As câmeras corporais são câmeras individuais para uso no uniforme das polícias, com capacidade de capacitação, gravação e transmissão de áudio, vídeo e localização geográfica. O equipamento possibilita o monitoramento remoto por uma central, além de armazenar dados em nuvens. As câmeras portáteis são acopladas aos uniformes e gravam automaticamente todas as atividades policiais durante o turno de serviço.

Dessa forma, todas as abordagens, fiscalizações, buscas, varreduras, acidentes e demais interações com o público são registradas, independentemente da ação do policial. Os dados são transmitidos em tempo real por meio de live streaming ou armazenados na nuvem para acesso remoto das autoridades de segurança e judiciais sempre que necessário.

Ao final do serviço, após classificar todos os vídeos, o policial entrega todo o material na sala de monitoramento e captação de mídia. Os registros garantem também os direitos individuais dos cidadãos, bem como preservam a atuação dos policiais, garantindo mais transparência e legitimidade às ações da corporação.

O uso de câmeras em uniformes já ocorre em Santa Catarina, São Paulo, Rio de Janeiro e Rondônia. Desses, apenas São Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina têm um número de câmeras superior a 10% do seu contingente policial. Os três Estados reúnem 93% das câmeras em operação no Brasil. Rio Grande do Norte tem apenas 15 câmeras já em operação.

Tensão
O número ideal de câmeras corporais para o efetivo é um dos pontos nebulosos da adoção do sistema. A corporação roraimense prevê licitação para a compra das câmeras, mas ainda não sabe se as ‘bodycams’, como também são chamadas, serão adquiridas para todo o efetivo, que conta, atualmente, com 3,5 mil policiais.

Em Santa Catarina, por exemplo, o governo disse que adquiriu número de câmeras suficiente para que, a cada dois policiais em serviço, um esteja equipado. O Estado tem 2.245 câmeras para um efetivo de 9.952 PMs.

Pesquisador em Direitos Humanos, o professor e coordenador do curso de Mestrado Profissional em Segurança Pública, Direitos Humanos e Cidadania da Universidade Estadual de Roraima (UERR), Edgard Zanette, atribui a lentidão na adoção de câmeras à tensão política, a um temor de que, na prática, possa haver uma tensão entre os policiais e o governador Antonio Denarium (Progressistas). Ele acredita que a adoção pode levar décadas, se não houver pressão da sociedade civil pela implantação.

“A gente tem um histórico, no Brasil, de atividade policial sem controle externo. As polícias são um contingente muito grande e forte politicamente. Em um contexto em que qualquer tipo de controle é visto por muitos policiais como problema, as câmeras geram uma reação corporativa muito forte. O melhor para o governador sempre é não se incomodar com elas, e isso vale para esquerda, direita, qualquer espectro político“, diz Zanette.

A comparação entre as experiências internacionais, apesar das diferentes formas e contextos de aplicação, apontou benefícios da política. “O uso de câmeras não traz nenhuma ameaça aos policiais, pelo contrário. Elas reduzem a agressividade das pessoas, melhoram a relação com as comunidades e melhoram, claro, o controle de qualidade da intervenção policial. Outra conclusão diz respeito ao tipo de tecnologia e quando ela é utilizada. Se o policial puder ligar e desligar o equipamento quando quiser, esquece. É colocar dinheiro fora”, diz Zanette.

Além da iniciativa do Governo de Roraima, tramita na Assembleia Legislativa do Estado de Roraima (ALE-RR) um projeto de lei que determina a criação de um programa que determina a instalação de câmeras corporais para as Forças de Segurança do Estado.

O projeto de lei ainda tramita nas comissões da Casa, sem previsão para ir ao Plenário. O presidente da Comissão de Segurança da Assembleia Legislativa de Roraima, deputado Rarison Barbosa (PMB), avalia que é preciso mais debates para que a proposta seja votada.

“As câmeras corporais são uma ferramenta importante, mas é preciso que o programa seja feito de forma adequada. Não podemos deixar o policial, em ação, desguarnecido, desprotegido. E, ao meu ver, as câmeras sozinhas não auxiliam neste aspecto. Afinal, hoje em dia, em todo lugar, existe uma câmera. É preciso que as câmeras sejam incorporadas junto a outras iniciativas que garantam a segurança dos policiais”, disse o parlamentar, que é policial penal licenciado.

Segundo o promotor de Justiça do Ministério Público de Roraima (MPRR), com atuação junto à Vara de Execução Penal, Antônio Scheffer, a demora para a criação do programa no Estado não se justifica justamente porque há poucos registros de policiais mortos no Estado, e que as câmeras podem contribuir para que este número permaneça baixo.

“São iniciativas que, sobretudo, garantem a lisura das abordagens policiais, como uma prova de que o trabalho está sendo feito. Se os policiais são os responsáveis por garantir a segurança da forma correta, deveriam ser os primeiros a defender o uso das câmeras”, destacou.

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