Terra Yanomami em Roraima. Foto: Leonardo Prado/PGR

O Ministério Público Federal (MPF) emitiu, nesta quarta-feira (30), recomendação ao ministro da Saúde para que nomeie um interventor para chefiar o Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (Dsei-Y). A medida é resultado de investigação em torno de desvio de recursos públicos para compra de medicamentos.

Segundo o documento, os indícios sugerem a participação de agentes públicos e privados em práticas fraudulentas em conluio com as duas últimas gestões do Dsei Yanomami.

O MPF também instaurou um inquérito civil após denúncias relatando a falta de medicamentos para tratamento de saúde dos indígenas – especialmente verminoses e malária – e consequente crescimento dos registros de infecções, com manifestação de formas graves dessas doenças.

No decorrer das apurações, identificou-se que o Dsei Yanomami contratou no ano de 2021 o valor de R$ 3 milhões em medicamentos essenciais – incluindo o vermífugo albendazol -, mas apenas uma parte muito pequena foi efetivamente entregue ao órgão de saúde e distribuída aos indígenas.

Segundo o MPF, a investigação indica que os valores apontados em notas fiscais da empresa fornecedora eram integralmente pagos mesmo sem a entrega total dos medicamentos.

O esquema também simulava o envio de medicamentos para as aldeias da TI Yanomami por meio de registros falsos no Sistema Nacional de Gestão da Assistência Farmacêutica. Para evitar o total desabastecimento e disfarçar as irregularidades, a empresa contratada realizava doações de medicamentos em pequenas quantidades.

Causas

Segundo o MPF, essas irregularidades decorrem da nomeação de coordenadores distritais por critérios políticos ao invés de técnicos. Conforme apurado no inquérito civil, os dois últimos gestores do Dsei Yanomami eram agentes sem nenhuma experiência em saúde pública ou povos indígenas.

Os indícios de irregularidades na licitação e na execução do contrato para fornecimento de medicamentos, bem como a facilidade de inserção de dados falsos nos sistemas de controle demonstraram a fragilidade da supervisão exercida pela SESAI.

Impactos

O esquema identificado resultou no desabastecimento generalizado de medicamentos essenciais nas unidades de saúde da Terra Indígena Yanomami. Os dados relativos à cobertura de tratamento para verminose demonstram que mais de 10 mil crianças ficaram desassistidas, aprofundando a tragédia humanitária dos Yanomami.

No período de vigência do esquema, mais de 300 crianças yanomami vítimas de desnutrição e malária tiveram que ser removidas de suas comunidades de origem para receberem tratamento de média ou alta complexidade no Hospital da Criança em Boa Vista.

Recomendação

Por se tratar de irregularidades amplamente disseminadas no Dsei-Y, o MPF quer que o Ministério da Saúde nomeie um interventor para a chefia do órgão e para garantia da correta aplicação das verbas destinadas ao atendimento dos indígenas.

O órgão recomenda que essa nomeação siga critérios técnicos e que o interventor tenha experiência e conhecimento em gestão de saúde e de políticas públicas aos povos indígenas.

O interventor também deverá investigar as denúncias apresentadas, assumir o controle dos contratos já firmados e apresentar um cronograma de ações para garantir o pleno restabelecimento do estoque de medicamentos e sua dispensação aos estabelecimentos de saúde da TI Yanomami.

Segundo o MPF, a intervenção deverá ser mantida pelo tempo necessário para que as medidas de reestruturação da saúde yanomami sejam implementadas.

O órgão quer ainda que a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) crie um grupo específico (Sala de Situação) para acompanhar em tempo real a situação da saúde na Terra Yanomami, especialmente o surto de malária, os altos índices de desnutrição e a crônica falta de medicamentos decorrentes das irregularidades apuradas pelo MPF.

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