Impacto do garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami - Foto: arquivo/ Dario Kopenawa

Além dos reconhecidos impactos ambientais, a presença de garimpo não traz benefícios econômicos ou sociais para as cidades, revela um novo estudo do Instituto Socioambiental (ISA). Segundo o levantamento, que cruzou dados de Índice de Progresso Social (IPS) e da ocorrência de garimpo na Amazônia legal, os municípios que convivem com o garimpo possuem, em média, IPS 4% menor que a média amazônica, e 20% abaixo do índice do Brasil.

O estudo também fez uma comparação entre os IPSs de Roraima e do Pará de 2014 a 2021, intervalo de tempo em que houve um escalonamento das atividades garimpeiras na região. Nesse período, nos municípios sem áreas degradas pelo garimpo, o índice aumentou, em média, 1%. Já as cidades que têm garimpo em Terras Indígenas (TIs), tiveram queda de 2%.

— Isso desmonta a narrativa dos garimpeiros e dos grupos ilegais, que dizem que a atividade traz retorno econômico, com geração de emprego e de benefícios para a cidade. A gente vê que é exatamente oposto. Se há benefício financeiro, esse recurso não está ficando no município. Vai para algum lugar, e no município só ficam o impacto ambiental e a necessidade do poder público gastar dinheiro para reparar os danos — afirma Antonio Oviedo, assessor do ISA, e autor do estudo, ao lado de Victor da Silva Araújo.

De acordo com as estatísticas de 2021, o IPS médio das cidades garimpeiras é 52,4. Já o IPS médio da Amazônia Legal é 54,5 – 4% maior; e o do país é 63,3 – 20% maior. O Índice de Progresso Social agrega indicadores sociais e ambientais de: necessidades humanas básicas, fundamentos de bem-estar e oportunidades. O IPS combina uma série de de bases de dados, inclusive internacionais, além de pesquisas de percepção, para identificar o cenário, os desafios e as oportunidades de progresso social dos países e municípios.

Já os dados de garimpo foram extraídos dos levantamentos do MapBiomas, e então realizados os cruzamentos. A série histórica, de 36 anos, da ONG mostra que a área de garimpo na Amazônia legal cresceu 10 vezes nas últimas três décadas. Em 2020, o garimpo ocupou 105.311 hectares, um recorde histórico, valor 940% maior que o de 1985, quando começou a série. Para o novo estudo do IPS, não houve diferenciação entre garimpo ilegal ou a atividade legalizada.

O garimpo causa impactos diretos e indiretos. À saúde, por exemplo, um dos maiores danos é a exposição ao mercúrio, após rios e peixes serem contaminados, o que, no fim da cadeia, acaba afetando a população. Por causa da migração de peixes, estudos mostram que os impactos do garimpo podem atingir um raio de 100 quilômetros. Problemas sociais também são agravados pela presença de grupos criminosos, no caso de garimpo ilegal, que aliciam indígenas com chantagens e atos de violência.

Diante desse contexto, o poder público dessas cidades, em muitos casos que já dispõem poucos recursos, precisa priorizar o combate às ilegalidades, deixando descobertas outros programas importantes, explica Oviedo.

— Há uma série de impactos adicionais, o que gera mais gastos públicos, no sistema de saúde, demandas de segurança pública, de assistência social e de fiscalização — disse o especialista.

Regiões onde o garimpo está dentro de Terras Indígenas (TIs), uma ilegalidade flagrante, sofrem ainda mais, mostra o estudo. Oviedo diz que foram priorizadas, para o levantamento, a área dos Munduruku, Kayapós e Ianomâmis, os que mais sofrem, hoje, com o garimpo.

Mulheres não querem mais engravidar, por causa do mercúrio, diz moradora

Coordenadora da Associação Indígena Pariri Muduruku, e da Federação dos Povos Indígenas do Pará, Alessandra Munduruku diz que os danos causados pelo garimpo são vistos na prática pela população indígena. Ela vive em Itaituba, um dos municípios onde mais há exploração de ouro no país. O IPS da cidade é de 53, 3% abaixo da média da Amazônia.

— O garimpo entra, destrói as nascentes e os rios com a contaminação por mercúrio. E aí não deixam nada em troca. Quem busca a melhoria dos territórios, da saúde, da educação, somos nós, indígenas — afirma ela, que diz que os “empresários” do garimpo hoje já compram pescados do Mato Grosso, para alimentar os funcionários, já que os peixes da própria região estão contaminados. — A gente depende dos rios e das florestas, mas aí vem os brancos dizerem que a gente precisa de garimpo.

Ela, que conta já ter sofrido ameaças de garimpeiros, diz que nos últimos anos houve um aumento da atividade ilegal, impulsionado pela postura do governo federal e do presidente Bolsonaro.

— Atualmente já há mulheres que não querem mais engravidar, por causa do medo do mercúrio — lamenta a liderança, que diz que muitos indígenas são aliciados para facilitarem o garimpo. — Oferecem cestas básicas, combustível. Como estamos com dificuldade de acesso aos programas sociais, fica mais fácil para os garimpeiros entrarem e corromper as lideranças. Eles prometem que o garimpo vai trazer melhorias e prosperidade.

Procurado, o Instituto Brasileiro de Mineração disse que é “contrário ao garimpo e à comercialização ilegais de minérios”, pois “provocam uma série de danos ao ambiente e à economia, prejudicam e também matam pessoas, entre as quais, povos indígenas, além de fomentarem atividades criminosas diversas”. O Ibram defende a mineração “que adota boas práticas em ESG, é responsável com o ambiente e com as pessoas, segue a legislação, gera empregos legítimos, renda, recolhe tributos e contribui para o desenvolvimento socioeconômico e ambiental do país e está agindo para as atividades ilegais sejam inibidas cada vez mais”.

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