Foto: Ascom MPF

O Ministério Público Federal (MPF) inspecionou acampamentos de indígenas Yanomami nos arredores da Feira do Produtor, em Boa Vista (RR), e constatou situação de precariedade e violações de direitos que afetam, aproximadamente, 40 pessoas, incluindo crianças, adolescentes e gestantes. A ação ocorreu na última segunda-feira, 13 de outubro.

A diligência foi realizada em conjunto pela equipe do 7º Ofício da Procuradoria da República em Roraima, responsável pela Defesa dos Direitos Indígenas e das Minorias, e a Força Tarefa da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Antes da vistoria, as equipes já tinham se reunido para tratar dos fluxos pendulares, ou seja, dos deslocamentos frequentes de indígenas das regiões de Xexena e Ajarani, sul de Roraima.

Famílias em situação de vulnerabilidade – A inspeção identificou que os indígenas, divididos em dois grupos, estavam acampados em vias públicas. As famílias vivem em condições inadequadas, com instalações improvisadas, sem acesso à água potável, saneamento básico ou infraestrutura mínima de abrigo e higiene. Além disso, o acampamento fica próximo a vias com grande tráfego de veículos, o que representa riscos, especialmente para as crianças.

As equipes identificaram, ainda, situações que demandam atenção à saúde e assistência social. Informações colhidas no local indicam que algumas crianças do grupo já foram institucionalizadas por determinação judicial, em decorrência de situações de risco identificadas em deslocamentos anteriores, o que reforça a recorrência do problema.

A equipe da Funai tentou convencer os grupos a retornarem à Terra Indígena (TI) Yanomami, oferecendo transporte. No local, a Secretaria de Estado do Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes) prestou assistência alimentar emergencial, evidenciando o esforço conjunto dos órgãos.

Falta de assistência adequada – O deslocamento frequente de famílias indígenas das comunidades para a cidade ocorre por diversos motivos, entre eles: o acesso a serviços de saúde especializados, transações bancárias e circulação em territórios tradicionais. No entanto, a falta de espaço adequado para acolhimento temporário e a dificuldade de articulação entre órgãos federais, estaduais e municipais, além da insuficiência de assistência, tanto nos territórios quanto durante os deslocamentos, resultam em situação precária dos indígenas.

Resultado da inspeção – Como resultado da inspeção, o MPF solicitou providências ao Distrito Sanitário Especial Indígena (Dsei) Yanomami em relação às situações identificadas e a apresentação, pela Funai, de plano de ação voltado aos fluxos pendulares. Além disso, o MPF tem acompanhado a articulação com órgãos do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (SGDCA), para proteger crianças e adolescentes em situação de risco, e o monitoramento da implementação do Protocolo de Atendimento pelo SGDCA de Roraima.

O MPF reforça que continuará cobrando ações estruturantes para garantir os direitos dos povos Yanomami, assegurando que seus deslocamentos não resultem em vulnerabilidades ou violações.

Atuação há mais de uma década – O MPF atua há mais de dez anos na proteção dos direitos dos povos Yanomami e Ye’kwana durante os fluxos pendulares. Para garantir assistência adequada aos indígenas das comunidades Xexena e Maimasi, o MPF ajuizou uma ação civil pública contra a União, em 2019, que resultou na instalação de uma Base de Proteção Etnoambiental e um posto de saúde na região. Parte dos pedidos, como a inclusão do Estado de Roraima e dos municípios como responsáveis pela assistência urbana, ainda aguarda decisão judicial.

Entre 2021 e 2023, o MPF liderou o Grupo de Trabalho Fluxos Pendulares Yawari, reunindo diversos órgãos para estruturar respostas à vulnerabilidade de indígenas em trânsito, mas o GT foi desativado antes da implementação efetiva das medidas. A partir de 2023, ações federais foram intensificadas na TI Yanomami, com planos interministeriais e a decretação de emergência em saúde pública, representando avanço no enfrentamento da crise, embora ainda exijam execução coordenada.

Em 2024, o MPF passou a dialogar com a Funai para construir um plano de ação específico voltado aos fluxos pendulares com foco na assistência indigenista permanente nos territórios, apoio durante os deslocamentos e acolhimento adequado nas áreas urbanas. Como resposta, a Funai se comprometeu em apresentar o plano e reativar o Grupo de Trabalho para validação interinstitucional e operacionalização das medidas.

O MPF enfatiza, que, no mesmo ano, foi elaborado o Protocolo de Atendimento de Crianças, Adolescentes e Jovens dos Povos Yanomami e Ye’kwana, desenvolvido pela Universidade de Brasília (UNB) em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDH). Construído com ampla participação do SGDCA dos estados do Amazonas e Roraima, o documento define diretrizes técnicas e fluxos operacionais para um atendimento culturalmente adequado. O protocolo ainda aguarda validação pelas instâncias representativas dos povos para ser implementado pelos órgãos locais.

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