Senador Mecias (Republicanos-RR). Foto: ascom parlamentar.

O Projeto de Lei 5073/2025, apresentado pelo senador Mecias de Jesus, pretende estender o seguro-defeso, tradicionalmente destinado aos pescadores artesanais, aos trabalhadores da pesca esportiva. Embora a iniciativa pareça, à primeira vista, um gesto de sensibilidade social, ela escancara um risco sério: o desvirtuamento completo de uma política pública criada para proteger o meio ambiente e garantir a sobrevivência de categorias específicas que efetivamente dependem da captura do pescado para subsistir.

O seguro-defeso não é um benefício de compensação econômica genérica. Ele foi concebido como um instrumento de preservação ambiental e de proteção ao pescador artesanal, que suspende sua atividade para permitir a reprodução das espécies e, em troca, recebe um amparo temporário. É uma lógica simples: quem depende diretamente da pesca para comer, e não para prestar serviços turísticos, precisa ter renda quando a pesca fica proibida. Alterar essa lógica, como propõe o senador, significa abrir uma porta larga para usos oportunistas e expansões indefinidas do benefício.

A pesca esportiva não tem a mesma relação de subsistência com o recurso natural. Os profissionais envolvidos em atividades turísticas, como guias, pilotos e cozinheiros, prestam um serviço que, embora ligado ao ambiente aquático, não consiste na retirada do pescado para consumo ou comércio. A paralisação temporária de suas atividades, ainda que gere impactos econômicos, não se equipara à realidade do pescador artesanal, cuja renda e alimentação dependem diretamente da captura do peixe. Equiparar universos tão distintos beira o absurdo.

O argumento apresentado por Mecias, de que garantir renda aos trabalhadores da pesca esportiva reforçaria a proteção ambiental, inverte a lógica da política pública. O seguro-defeso não é um programa de renda emergencial nem um instrumento de estímulo ao turismo; é uma medida técnica, baseada em critérios biológicos e sociais claros. Criar novas categorias beneficiárias sob o pretexto de justiça social enfraquece a credibilidade do sistema e aumenta a pressão fiscal, ainda que o projeto tente se blindar com a exigência de “previsão orçamentária”.

Além disso, a proposta cria um precedente perigoso: se os trabalhadores da pesca esportiva devem receber seguro-defeso, por que não os trabalhadores de hotéis, pousadas e todo o trade turístico afetado indiretamente pelo período de proibição? Ou ainda profissionais de outros setores que sofrem impactos sazonais? A ampliação desenfreada do benefício tornaria o seguro-defeso irreconhecível, substituindo uma política de conservação ambiental por mais um mecanismo de transferência de renda sem foco definido.

O país já enfrenta desafios sérios para fiscalizar o uso correto do seguro-defeso, incluindo fraudes amplamente documentadas. Expandir sua abrangência sem critérios rigorosos só agrava o problema e enfraquece uma ferramenta essencial para a preservação das espécies e a manutenção de comunidades tradicionais que realmente dependem do ecossistema.

Em vez de ampliar o benefício para setores que não se enquadram em sua finalidade original, o Senado deveria discutir políticas específicas para trabalhadores do turismo que enfrentam sazonalidade. Misturar instrumentos e finalidades apenas produz confusão e abre brechas para distorções.

Se o objetivo é proteger o meio ambiente e apoiar categorias vulneráveis, o caminho não é flexibilizar um benefício criado com propósitos claros. O caminho é fortalecer o seguro-defeso para quem de fato dele precisa e construir outras políticas para realidades diferentes. O projeto do senador Mecias, ao tentar unir tudo em um único instrumento, acaba por comprometer tanto a política ambiental quanto a responsabilidade fiscal.

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