
O Conselho do Povo Indígena Ingarikó (Coping) lançou o roteiro “Observação de aves na Serra do Sol”, primeiro passo para organizar o turismo na região Wîi Tîpî, no norte da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima. Os próprios Ingarikó elaboraram a proposta, que segue seus protocolos comunitários e conta com apoio da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). O Instituto Socioambiental (ISA) disponibilizou a publicação, com 208 páginas, nesta quinta-feira (04/12). O documento se baseia em uma expedição experimental realizada em março de 2024 e foi preparado conforme a Instrução Normativa 03/2015 da Funai, que regulamenta o turismo em Terras Indígenas.
O roteiro estima que cada expedição pode gerar até R$ 50 mil, beneficiando 45 indígenas envolvidos diretamente no trabalho, além de artesãs, cozinheiras e outras atividades tradicionais. Parte dos recursos deve compor um fundo comunitário. A elaboração contou com a participação do Coping, da Kraioapa Assessoria, do ICMBio de Roraima e de uma equipe multidisciplinar no âmbito do Projeto Aves na Terra de Siikë, financiado pela Fundação Grupo Boticário entre 2023 e 2025, com apoio da Funai e do ISA.
O presidente do Coping, Vitalino Ingaricó, afirma que o turismo pode fortalecer a permanência dos jovens no território ao criar novas oportunidades econômicas. Após dois anos de trabalho, o Coping entregou o roteiro à Funai com pedido de anuência para iniciar as expedições. A população Ingarikó é estimada em cerca de 2 mil pessoas que vivem em 16 comunidades. O projeto busca envolver jovens na cadeia do turismo e ampliar as fontes de renda locais com práticas socioambientalmente sustentáveis.
A expedição experimental ocorreu no fim de março de 2024, com duração de sete dias. Participaram seis turistas estrangeiros, um guia da Ornis Birding Expeditions, dois integrantes do Projeto Aves na Terra de Siikë e 45 Ingarikó remunerados pela atividade. Os Ingarikó já haviam realizado expedições turísticas entre 2010 e 2014, após participarem de capacitações promovidas por instituições como IFRR, Sebrae e ICMBio.
A equipe técnica coordenada pela antropóloga Virginia Amaral selecionou a operadora responsável, organizou oficinas de governança e planejou a expedição em 2023. Em 2024, o roteiro foi testado com turistas dos Estados Unidos, Suíça e Bélgica. A trilha tem início na comunidade Karumanpaktëi e atravessa área de sobreposição entre a região Wîi Tîpî e o Parque Nacional do Monte Roraima, onde ICMBio e Ingarikó realizam monitoramento da biodiversidade. O documento destaca que a região tem forte potencial turístico por reunir diversidade biológica, paisagens singulares e espécies endêmicas.
Os Ingarikó decidiram que até quatro expedições poderão ocorrer por ano, com grupos de até dez visitantes. A comunidade considera essa frequência adequada para garantir qualidade no atendimento sem comprometer as atividades tradicionais. O roteiro prevê ações de preparação, operação e pós-expedição. A remuneração total estimada para os 45 trabalhadores é de R$ 34,5 mil, além de cerca de R$ 16 mil previstos com a venda de artesanato e serviços tradicionais.
A região indicada no roteiro registra mais de 80 espécies típicas do Pantepui, formação do escudo das Guianas marcada por alto endemismo. O documento cita espécies como o bico-de-lança e o surucuá-mascarado. O Brasil se destaca no birdwatching e ocupava, em 2023, o 11º lugar em registros na plataforma global eBird. A WikiAves contabilizava, em fevereiro de 2025, mais de 51 mil observadores cadastrados, 5,5 milhões de registros e 1.962 espécies catalogadas.







