Governador Antonio Denarium (PP). Foto: divulgação.

Com o mandato sob ameaça no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o governador de Roraima, Antonio Denarium (Progressistas), contraiu, em 2023, o maior empréstimo da história recente do Estado, no valor R$ 805,7 milhões, que corresponde a 31% dos R$ 2,59 bilhões contratados por Roraima nos últimos 20 anos. Com juros, o crédito chegará a R$ 1,6 bilhão, a ser pago em dez anos.

O recurso, aprovado pela Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR), não tem plano detalhado de aplicação. A justificativa apresentada menciona, de forma genérica, investimentos em infraestrutura, segurança, saúde e gestão, mas sem indicar como serão executados.

Denarium teve o primeiro dos quatro pedidos de cassação acatados pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE-RR) no mesmo ano em que contraiu o empréstimo milionário, por uso eleitoral dos programas sociais Cesta da Família e Morar Melhor. Após condenação e apresentação de recursos, o processo foi levado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2024, mas ficou paralisado por mais de um ano, mesmo após a leitura do relatório e as sustentações orais identificarem abuso de poder eleitoral.

Dois anos depois, em 26 de agosto de 2025, o TSE retomou a análise, com a relatora do processo, ministra Isabel Gallotti, votando pela cassação da chapa e propondo a realização de novas eleições. No entanto, logo em seguida, o julgamento foi novamente suspenso por um pedido de vista do ministro André Mendonça, sem nova data prevista para conclusão.

Dívida crescente

De acordo com o Sistema de Análise da Dívida Pública e Operações de Crédito e Garantias da União, Estados e Municípios (Sadipem), o empréstimo de R$ 805,7 milhões, feito junto ao Banco do Brasil, não é o único peso para as contas de Roraima. Com a inclusão de encargos financeiros que chegam a R$ 795,9 milhões, o valor total da operação sobe para R$ 1,601 bilhão, a ser quitado ao longo de dez anos.

A última movimentação registrada na plataforma indica que o pedido foi encaminhado, em maio de 2024, à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, etapa necessária para validar a operação de crédito. O dado revela que, embora aprovado pela Assembleia Legislativa, o empréstimo ainda depende de trâmites burocráticos em instâncias federais, o que pode prolongar o prazo para a liberação integral dos recursos.

Custos financeiros cobrados pelo Banco do Brasil (Sadipem/Reprodução)

Questionamentos na Justiça

O empréstimo foi alvo de questionamentos logo após a aprovação, em outubro de 2023, quando uma ação civil pública foi protocolada para contestar a legalidade da operação, apontando falta de transparência na destinação dos recursos e riscos de impacto negativo nas contas do Estado. Além disso, o deputado federal Duda Ramos (MDB) também ingressou com ação própria, reforçando as críticas à ausência de detalhamento sobre como os valores seriam aplicados nas áreas citadas pelo governo.

A pressão sobre as contas públicas ficou ainda mais evidente com a Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2025. O documento prevê que Roraima terá de desembolsar R$ 377,8 milhões para o pagamento de juros, encargos e amortizações da dívida acumulada. Para se ter uma ideia da dimensão do valor, o gasto anual previsto para a Universidade do Estado de Roraima (UERR) é de R$ 105,7 milhões — ou seja, quase quatro vezes menor.

Previsão de impacto no orçamento de 2025 dos juros e encargos dos empréstimos feitos em 19 anos (Foto: Seplan/Reprodução)

Contas desequilibradas

Desde que assumiu o cargo, em 2019, Antonio Denarium alterou o quadro fiscal do Estado. Em 2020, seu primeiro orçamento próprio resultou em superávit de R$ 900 milhões, caindo para R$ 637 milhões no ano seguinte. Em 2022, ano da reeleição, as contas fecharam com déficit de R$ 77,7 milhões, mas se recuperaram em 2023, com um superávit de R$ 78 milhões, segundo o Tesouro Nacional.

O chamado resultado primário, que compara receitas e despesas sem considerar juros e encargos da dívida, mostra a oscilação fiscal de Roraima no período.

Resultado primário de 2017 a 2023 do Governo de Roraima (Tesouro Nacional/Reprodução)

Arrecadação em alta

Na avaliação do economista Rubens de Souza Farias, o empréstimo não é necessário porque, nos últimos anos, Roraima bateu recorde de arrecadação de tributos. Para ele, uma operação de crédito só seria tolerável caso o Estado passasse por uma severa situação de emergência.

“Com excesso de arrecadação, para que fazer empréstimo? Acredito que empréstimo se faz quando há alguma fatalidade, fenômeno da natureza que impeça a atuação econômica. Aqui há problemas com a imigração venezuelana, mas não consigo enxergar nenhuma aplicação para se contrair esse empréstimo. Não vejo como uma boa saída”, afirmou o especialista.

Para Rubens Farias, o governador descumpriu promessas de enxugar a máquina pública. “Para se reeleger, ele [Denarium] falou em cortar secretarias extraordinárias, porém fez o contrário: criou mais. Tudo isso é despesa. Não existe secretaria que não tenha gasto com administrativo e pessoal”, analisou.

A arrecadação tributária de Roraima variou positivamente em quase 20%, passando de R$ 2,351 bilhões em 2023 para R$ 2,7 bilhões em 2024, conforme dados da Secretaria de Estado de Planejamento e Orçamento (Seplan).

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