O governador de Roraima, Antônio Denarium (PP), tenta transformar a recente conexão do Estado ao Sistema Interligado Nacional (SIN) em um marco de redenção econômica e política. Em entrevista ao Poder360, Denarium afirmou que o Estado “vive uma realidade totalmente diferente de 2018”, com “energia limpa e segurança”, e celebrou a redução de “mais de 95% nos apagões”.
O discurso otimista, contudo, contrasta com uma realidade mais complexa. Embora a conclusão do Linhão de Tucuruí, entre Manaus e Boa Vista, represente um avanço histórico, o projeto foi entregue com anos de atraso, custos elevados e forte dependência do governo federal. Denarium atribui a si próprio a retomada das obras, mas omite que o destravamento judicial e ambiental ocorreu por meio de decisões da União e do licenciamento conduzido pelo Ibama — após décadas de impasse com comunidades indígenas.
“Começamos um grande trabalho para resolver esse gargalo que atrapalhava o desenvolvimento de Roraima”, disse o governador, sem mencionar que o empreendimento foi autorizado em 2011 e paralisado por falta de articulação política e diálogo com os povos afetados.
Crescimento econômico: números sem base sólida
Ao citar um crescimento acumulado de 37% do PIB em seis anos, Denarium apresentou o dado como prova de eficiência administrativa. No entanto, o percentual não foi detalhado: não há menção às fontes, nem ao impacto da inflação e da base de comparação — anos de crise e recessão. Especialistas em contas regionais lembram que o crescimento de Roraima, embora expressivo, é fortemente influenciado por transferências federais e pelo setor público, que ainda respondem por boa parte da renda estadual.
O governador também destacou o “trabalho forte no setor primário”, mas o Estado segue enfrentando entraves fundiários e ambientais que limitam o avanço sustentável do agronegócio. Apesar de mencionar investimentos em biomassa e energia limpa, Denarium não apresentou metas concretas de transição energética nem dados sobre redução de emissões.
A retórica da eficiência fiscal
Ao afirmar que Roraima passou de “nota D para nota A em capacidade de pagamento”, Denarium procurou reforçar sua imagem de gestor austero. O dado é relevante, mas não reflete necessariamente melhoria nas políticas públicas. O pagamento de dívidas herdadas e a regularização fiscal ocorreram em parte graças ao aumento das transferências federais durante a pandemia e ao crescimento do Fundo de Participação dos Estados (FPE) — variáveis externas à gestão estadual.
Além disso, o governador cita o pagamento de R$ 3,7 bilhões de dívidas passadas, sem detalhar a origem dos recursos nem o impacto sobre investimentos em saúde, educação e infraestrutura. A autodeclaração de “melhor Estado do Brasil em qualidade de informações contábeis e fiscais” soa mais como propaganda do que como política de transparência efetiva.
O futuro ainda em disputa
Ao final, Denarium se coloca como o líder que “resgatou” Roraima da calamidade. Mas sua entrevista revela um governo que ainda se apoia em narrativas de redenção, enquanto os desafios estruturais permanecem: dependência de Brasília, vulnerabilidade ambiental e baixo índice de industrialização.
O fornecimento estável de energia é, sem dúvida, um avanço histórico para Roraima. Mas a história recente do Estado mostra que discursos de progresso sem crítica e sem transparência costumam durar menos do que as obras que os inspiram.








