Antonio Denarium e Hiran Gonçalves. Foto: Secom RR

A cassação do mandato do governador de Roraima, Antonio Denarium, determinada pelo Tribunal Regional Eleitoral de Roraima (TRE-RR), por abuso de poder político e econômico, remete a reflexões urgentes sobre a responsabilização de toda a chapa que se beneficiou politicamente desse esquema. Um dos nomes centrais dessa aliança é o do senador Hiran Gonçalves (PP), eleito em 2022 na mesma coligação e partido de Denarium.

Se de fato houve uso da máquina pública e de programas sociais como instrumento de captação de votos, não se trata apenas de uma falha ética de um candidato, mas de um problema sistêmico que coloca em risco a integridade do processo eleitoral de todo o bloco.

O TRE-RR cassou Denarium em razão de irregularidades na distribuição de cestas básicas no ano eleitoral de 2022. Segundo a corte, programas sociais foram ampliados de forma abrupta e com “intuito eleitoreiro”, o que configurou conduta vedada. Além disso, a ação eleitoral apontou que a distribuição de recursos sociais estava associada a promoção pessoal, favorecimento de prefeituras aliadas e reforço da campanha majoritária.

A ministra-relatora do TSE, Maria Isabel Galotti, reforçou essa visão ao votar pela cassação definitiva, observando que muitos dos atos ilícitos foram “acompanhados de ato de notória promoção pessoal do recorrente”.

Portanto, o fato de a Justiça Eleitoral já ter avaliado – em instância regional – que houve abuso de poder econômico e eleitoral oferece um fundamento sólido para questionar o grau de envolvimento e benefício dos demais integrantes da aliança de Denarium.

É fato público que Hiran Gonçalves foi eleito senador na mesma chapa política de Denarium: nas eleições de 2022, ele concorreu ao Senado pelo PP, igual ao governador, e havia cooperação declarada entre ambos. Durante a campanha, foram noticiados atos de aliança formal. Mais importante: o TRE-RR abriu processo não apenas contra Denarium, mas também contra o então candidato ao Senado, Hiran Gonçalves, por abuso de poder econômico, uso indevido de recursos públicos e outras irregularidades de campanha.

Esse fato demonstra que as suspeitas que levaram à cassação de Denarium não ocorrem em um vácuo, mas em contexto de aliança completa, com os mesmos atores, os mesmos beneficiários e provavelmente uma estratégia conjunta para mobilizar eleitores por meio de programas sociais.

Se aceitarmos que Denarium utilizou programas sociais para fins eleitoreiros – como concluiu o TRE – é legítimo perguntar: como Hiran Gonçalves não poderia ser considerado beneficiário indireto, senão ativo, desse esquema? Ainda que o governador não tenha sido condenado (até agora) pelo TSE, já temos um norte vindo daquela Corte que compreende que a ação do grupo político durante aquele pleito foi irregular.

Em regimes democráticos, a participação eleitoral de candidatos em chapas deve implicar também responsabilidade conjunta. Aliança eleitoral não é apenas marketing: ela tem consequências concretas, sobretudo quando o uso da máquina pública é questionado. A hipótese de que Hiran tenha sido alavancado por recursos assistenciais voltados para captar votos deveria motivar não apenas debates públicos, mas também vigilância institucional.

O julgamento no TSE é a etapa decisiva. Se a decisão da ministra-relatora – que defendeu a cassação e a convocação de novas eleições – se confirmar, abre-se a possibilidade de que todos os elementos da chapa sejam responsabilizados, não apenas Denarium. Isso inclui, por lógica política e moral, o senador Hiran Gonçalves, se comprovado que ele foi parte da estratégia eleitoral beneficiada pelo abuso.

Em termos institucionais, há precedentes e possibilidades para que magistrados eleitorais ou mesmo o Senado, por pressão política, avaliem medidas de afastamento ou cassação, caso seja evidenciada participação direta ou benefício substancial por parte de Hiran.

Não se trata de uma retórica puramente acusatória: é uma chamada à responsabilização democrática. A Justiça Eleitoral já deu sinais claros: o abuso de poder político e econômico de Denarium foi reconhecido pelo TRE. Agora, a sociedade e as instituições têm a oportunidade (e a obrigação) de avaliar até que ponto esse esquema envolveu e elevou outros atores da mesma base política, especialmente aqueles que se beneficiaram eleitoralmente, como Hiran.

Exigir transparência não é pedir vingança, mas garantir que a democracia sobreviva com integridade. É garantir que o voto não seja comprável, que os programas sociais não sejam utilizados como cabos eleitorais, e que quem subiu ao poder mediante benefícios indevidos arque com as consequências.

Hiran Gonçalves não pode se dissociar de forma confortável da condenação de Denarium: ambos fizeram parte de uma chapa majoritária, ambos foram beneficiados eleitoralmente por uma estratégia que a Justiça Eleitoral considerou ilegal. Para preservar a confiança pública, é fundamental que ele explique publicamente seu papel nessa aliança, que o TSE conclua seu julgamento com celeridade e transparência, e que, se comprovado algum grau de participação, haja responsabilização institucional. Caso contrário, corre-se o risco de subestimar a gravidade de práticas que corroem a própria base da democracia.

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