O coordenador-geral da Associação dos Povos Indígenas da Terra São Marcos (APITSM), Marcelo Pereira Macuxi, denunciou o turismo ilegal no território e a poluição dos rios causada pelo lixão a céu aberto, responsabilidade do município de Pacaraima, na região norte do Estado de Roraima. No local, vivem indígenas das etnias Macuxi, Taurepang e Wapichana.
“Eu não chamo de turismo, chamo de invasão. Pontos como a Cachoeira do Macaco e a Pedra Pintada são visitados clandestinamente todos os dias. Eles entram sem autorização, danificam o patrimônio arqueológico e cultural e ainda deixam lixo. Eu vou ser obrigado a limpar o lixo de invasor?”, desabafou Marcelo Macuxi.
Segundo o representante de 49 comunidades da Terra Indígena São Marcos, empresas e guias de turismo entram diariamente no território sem autorização prévia dos indígenas para visitar cachoeiras e o sítio arqueológico da Pedra Pintada, um dos pontos turísticos mais conhecidos de Roraima.
“Eles [os turistas] invadem e não tem vergonha de divulgar a invasão em suas redes sociais. Na Terra Indígena São Marcos, pra onde você for, tem alguém que cuida, zela e protege. Não é abandonado. Não é terra sem dono. A população que quer conhecer, tem que buscar informação nas comunidades, tem que ter permissão”, ressalta a liderança.
O coordenador geral da entidade revela, ainda, que os moradores das comunidades são capacitados para o acompanhamento de turistas que desejam conhecer as belezas do território, mas poucos visitantes preferem seguir o método legal para adentrar a região. Atualmente, a associação da Terra São Marcos trabalha para implantar o turismo cultural e sustentável.
“Nós queremos que o turismo gere ao menos um apoio econômico para as pessoas das comunidades. Estamos organizando para fortalecer o turismo cultural, guiado por indígenas que conhecem os perigos e belezas da região. Ensinar também aos turistas a consciência de manter os rios sem lixo, sem depredação”, completou o líder indígena.
Descarte de lixo no território
O representante da Associação dos Povos Indígenas da Terra São Marcos também revelou a longa escala de poluição causada pelo lixo que é coletado no município de Pacaraima e descartado dentro do território indígena.
O lixão existe há mais de 30 anos, mas só em dezembro do ano passado foi desativado devido à pressão de lideranças indígenas da região, que fecharam o acesso ao local diante da inércia do poder público para atender a denúncia. No mesmo período, o lixão foi alvo de protesto e abaixo-assinado por parte dos moradores da cidade.
Após anos sem ações concretas, a Prefeitura de Pacaraima se reuniu, no último dia 18 de janeiro, com o Ministério Público Federal (MPF), a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), a Associação dos Povos Indígenas da terra São Marcos (APITSM) e os moradores da comunidade Ouro Preto, onde fica localizado o lixão, para anunciar a implantação da primeira célula provisória de descarte de resíduos sólidos. O novo local para descarte do lixo ainda não foi definido.
“Ficou definido que a prefeitura se responsabilizará de buscar uma nova área, uma célula de aterro sanitário. Sugeriram que o novo local de aterro do lixo vindo da cidade fosse a Terra São Marcos, mas nos negamos. Também pedimos que a prefeitura garantisse a descontaminação total da área do lixão”, destacou o coordenador-geral.
Lixão polui cabeceira de rios
A liderança denuncia, ainda, que o lixão já poluiu a cabeceira de dois rios do território, o Miang e o Surumu. A água dos rios é utilizada no consumo e plantação dos moradores da região. Marcelo Macuxi conta que o município de Pacaraima foi sobreposto ao Território São Marcos e não possui área própria e, com a expansão urbana do município, foi criado o lixão.
“O antigo lixão cresceu tanto que caiu na boca de dois rios de onde os moradores extraem água para usar nas plantações, criação de animais e consumo próprio. Queremos resgatar a pureza das nossas águas e ter uma água de qualidade”, completou a liderança.
A Terra Indígena São Marcos, tradicional dos povos indígenas Macuxi , Wapichana e Taurepang, foi homologada em 30 de outubro de 1991 pelo governo federal. Já o município de Pacaraima só foi criado em 1995 por meio de uma lei estadual. Logo, a demarcação do território indígena é anterior ao município.
A reportagem tentou contato com o prefeito de Pacaraima, Juliano Torquato (Republicanos), mas não obteve resposta até o fechamento da reportagem.
Monitoramento aéreo
Um monitoramento com drone feito por lideranças e membros do Grupo de Proteção e Vigilância Territorial Indígena do Conselho Indígena de Roraima (PCIR) em janeiro deste ano também mostrou na região do Surumu, localizada entre a Terra Indígena São Marcos e Raposa Serra do Sol, a extensa área poluída pelo lixão do município de Pacaraima.
A denúncia é do coordenador regional do Surumu, Walter de Oliveira, que acompanhou a fiscalização e pediu providências ao Conselho Indígena de Roraima contra as invasões na região. Segundo ele, , as áreas mais afetadas pelo lixão na região de Surumu são as comunidades do Limão, Pedra do Sol, Canta Galo, São Jorge, Nova Vitória, Santa Isabel, São Miguel,Barro e o Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol (CIFCRSS).
“É uma situação que ela vem se arrastando há anos, em 1994, quando a gente fez a primeira visita, ele era bem pequeno, um lugar que dava para ser conservado. Lixo que estava sendo depositado ali dentro, mas com o crescimento da área urbana também cresceu o lixo, que agora é uma preocupação grande para nós”, completou o coordenador na denúncia ao CIR.