A rede Uma Concertação pela Amazônia lança hoje o plano ‘100 Primeiros Dias de Governo’, um documento com propostas em 14 eixos temáticos a ser apresentado aos futuros governantes em âmbito estadual e federal após as eleições do próximo domingo. O grupo é formado por mais de 500 pessoas e 250 organizações, dentre empresários, pesquisadores, ativistas, membros de governos e imprensa.
O plano foi construído ao longo de seis meses em 12 rodadas temáticas. São elas: governança; educação; saúde; segurança alimentar e nutricional; economia; segurança pública; ordenamento territorial e regularização fundiária; mineração; infraestrutura e cidades. Os encontros reuniram mais de 130 atores com o objetivo de construir propostas dedicadas às áreas.
[Esse documento] chega em uma semana de muita relevância para o país, em um momento em que precisamos reafirmar a nossa democracia, os direitos adquiridos na Constituição Federal de 1988. Um momento em que a gente precisa colocar a Amazônia além da visão de problema, que deixe de ser vista assim e passe a ser a solução. O nosso plano tem essa premissa, inclusive, indo além da agenda ambiental”, comenta a secretária-executiva da Concertação, Renata Piazzon.
Legislação
Segundo ela, um dos destaques do plano é o caráter ‘legal’ das propostas, já que são baseadas em sugestões de medidas provisórias, decretos presidenciais, resoluções e projetos de lei.
“São ideias que poderiam ser colocadas em um plano de governo. Fizemos uma seleção entendendo quais teriam mais chance de ser implementadas e chegamos a 14 atos normativos com o diferencial de termos feito isso com uma assessoria jurídica, que foi responsável pela instrumentalização [legal] das propostas”, pontua Renata.
Um exemplo é a sugestão de uma medida provisória que crie a Secretaria de Estado de Emergências Climáticas, órgão a ser vinculado à Presidência da República.
Outro diz respeito a um decreto presidencial que restabeleça o Programa Bolsa Verde, permitindo transferência de renda para famílias em situação de extrema pobreza em áreas florestais da Amazônia.
Articulação
Renata explica que após o lançamento do plano, o passo seguinte é articular com governos de transição e gestores eleitos para colocar as propostas em prática.
“Esse documento é só o início. Vamos nos estruturar para a sua implementação. É utilizar estratégia de diálogo, fazer articulação com governantes. Vamos fazer o mesmo com o Congresso, usando a força de consultorias e da Raps [Rede de Ação Política pela Sustentabilidade]”, comenta a diretora-executiva da Concertação.
A rede também compila no plano uma série de projetos de lei em tramitação no Congresso, ligados à temática socioambiental. Um exemplo é a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 37/2021, que inclui a questão climática como direito fundamental.
Representatividade
Uma das integrantes da Concertação, a ativista indígena e técnica em enfermagem Vanda Witoto participou de parte das reuniões para a construção do plano. Ela ressaltou a importância da iniciativa.
“A gente acredita que é um esforço por parte de alguns empresários que têm se colocado nessa preocupação de pensar o desenvolvimento da Amazônia a partir da perspectiva de escuta de alguns atores, da pessoas”, pontua.
Apesar da participação, Vanda avalia que a inclusão de amazônidas na construção de planos para a região precisa ser ampliada. “Acho importante ouvir aqueles que já desenvolvem a Amazônia, que estão em algum processo de construção”, comenta.
Segundo a Concertação, 20% dos integrantes da rede são pessoas da Amazônia. Nas rodas para elaboração das propostas, chegou-se ao percentual de 30%. “A gente queria muito que fosse a metade, ou seja, 50%, mas não conseguimos”, explica Renata.
Campanha de Lula ouviu propostas
Em setembro, a equipe de campanha do ex-presidente e candidato Luís Inácio Lula da Silva (PT) convidou a Concertação para uma reunião. O objetivo era conhecer as propostas da rede.
“Não era do nosso interesse procurar as campanhas, mas fomos convidados pela equipe do Lula e falamos do plano. As ideias foram muito bem acolhidas, um diálogo aberto”, afirma a diretora-executiva da Concertação.
Em relação ao atual presidente e candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL), não houve encontro. “Não nos reunimos, mas também não procuramos. No caso do Lula, foi porque surgiu como um convite da própria equipe dele”, comenta Renata.
Questionada sobre a abertura de Bolsonaro para as propostas, a considerar que o presidente costuma rejeitar dados negativos sobre degradação ambiental, Renata afirma que a Concertação estará aberta para o diálogo independente do candidato vencedor.
“Não tem como negar o retrocesso na área ambiental nos últimos quatro anos, especialmente na agenda de comando e controle, mas acreditamos que o plano é uma agenda integrada e reúne temas como educação e saúde, o que pode permitir uma abertura de diálogo”, frisa.
Candidatos com planos ‘genéricos’
A ativista indígena Vanda Witoto avalia que o tema ‘Amazônia’, incluindo a população e o combate aos ilícitos ambientais, ficou em segundo plano nas eleições d este ano.
“É um ponto que ainda falta nas discussões, tanto a nível estadual como de Brasil. Não vimos a pauta ambiental, indígena, da proteção na floresta”, comenta.
Nos planos de governo entregues à Justiça Eleitoral, os candidatos Lula e Bolsonaro detalharam pouco as propostas.
O petista defende o combate aos ilícitos ambientais, como desmatamento e queimadas, e diz que o garimpo ilegal será “duramente combatido”. Também fala em promoção da biodiversidade e da conservação da Amazônia. Durante a campanha, prometeu a criação do Ministério dos Povos Originários.
Bolsonaro fala em combate aos crimes ambientais e exalta a operação Guardiões do Bioma, da sua gestão, apesar de o desmatamento em 2022 ser o pior já registrado, segundo o Imazon.
O presidente também fala em concessão de florestas para a iniciativa privada e criação de bases na Amazônia “promovendo a efetiva presença do Estado”.