De dentro da reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, palco de uma histórica disputa de terras entre arrozeiros e povos locais, Irisnaide Macuxi, presidente da Sociedade de Defesa dos Índios Unidos do Norte de Roraima, filiada ao PL do notório Valdemar Costa Neto, vai disputar uma cadeira de deputada e se declara uma legítima apoiadora de Jair Bolsonaro entre um grupo étnico que, à primeira vista, pouco se identificaria com a retórica antiambientalista do capitão reformado.
Bolsonaro é conhecido pela posição refratária à questão indígena — já os chamou de “massa de manobra”, lamentou, quando ainda era deputado, que a colonização não exterminou todos eles e frequentemente os aponta como entrave para o avanço do agronegócio — mas Irisnaide afirma que mesmo entre os povos originários há, como ela, ferrenhos defensores do presidente. “Bolsonaro esteve aqui e pediu apoio. Os indígenas votaram nele e ele foi eleito. Agora cobramos e temos sido atendidos. Precisávamos de condições de produção que diminuíssem as multas ambientais e conseguimos”, diz.
Condecorada por Bolsonaro, ela defende o amplo desenvolvimento, produção agrícola e garimpo dentro das aldeias, além de debates menos engessados sobre exploração das terras, florestas e rios. É uma crítica dirigida às posições da principal adversária no estado. Desde o xavante Juruna, eleito deputado federal na década de 80, a única representante indígena no Congresso é Joênia Wapichana (Rede-RR), candidata à reeleição. Ela se define como militante das causas de esquerda e é apoiadora do ex-presidente Lula.
Na última eleição, a Justiça Eleitoral registrou crescimento de 56% de candidatos que se declararam indígenas, embora a representação de tribos no Parlamento ainda seja residual. “Nas eleições de 2022, os povos indígenas estão divididos em duas correntes, uma que enfatiza a pauta econômica, privilegiando o desenvolvimentismo, a agricultura, pecuária e atividades ligadas ao garimpo, e outra que apoia políticas de demarcação, além de uma agenda em que o índio é preservado sob todos os aspectos”, afirma o cientista político da Universidade de Brasília Paulo Kramer.
Apesar das divergências, as lideranças sonham com uma bancada de pelo menos cinquenta representantes no Congresso, uma meta bastante ambiciosa. “Por definição defendemos a terra e a natureza, e isso sempre vai ser um denominador comum entre todos nós. O povo indígena, mesmo na política, não precisa pensar sempre igual”, diz Joênia. A questão é exatamente essa. Quem olha de fora não vê, mas existem diversas tribos no Brasil.