Acossados pela agenda antiambiental do governo Bolsonaro nos últimos três anos, grupos indígenas decidiram mudar a estratégia para tentar eleger um número maior de representantes nas eleições deste ano. O trabalho para aumentar a bancada do cocar passa pela depuração de nomes mais competitivos, investimento nas campanhas e até a superação de rixas ancestrais entre as tribos para que elas se unam em torno de nomes de consenso.
Ao todo, cerca de 30 indígenas devem se candidatar a um assento na Câmara Federal e nas Assembleias estaduais por diferentes partidos, como PSOL, Rede, PT, tradicionalmente vinculados à causa, até o conservador Republicanos, ligado à Igreja Universal. O número de postulantes é sensivelmente menor do que os 130 que concorreram em 2018. A nova estratégia é apostar em menos candidaturas, mas com mais chances de vitória. Até hoje, apenas dois indígenas foram eleitos ao Congresso Nacional: Mário Juruna (PDT-RJ), em 1982, e Joênia Wapichana (Rede-RR) em 2018, que agora buscará a reeleição.
— O importante não é a quantidade, mas a viabilidade. Antes eram muitas e saíam por conta própria. Agora, nós estamos com a responsabilidade de preparar e organizar essas candidaturas — afirmou Sônia Guajajara (PSOL), coordenadora executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e pré-candidata a deputada federal em São Paulo.
A preparação consiste em disponibilizar equipes jurídicas e de comunicação para auxiliar as candidaturas e oferecer cursos de formação política. Também pretende-se captar recursos para investir nas campanhas dos nomes escolhidos pelas associações. As duas maiores hoje são a Apib e o Parlaíndio. Caberá a entidades como elas identificar nos estados aqueles postulantes com maior potencial eleitoral. Um dos pontos de partida para encontrar candidatos será um site que reunirá cadastros de indígenas interessados em disputar o pleito deste ano.
A eleição da deputada Joênia Wapichana sintetiza o desafio eleitoral dos povos indígenas em 2022. Ela se tornou exemplo de que é possível unir comunidades distintas e até rivais para conseguir a eleição. Em Roraima, há mais de oito povos com idiomas e culturas próprios — e séculos de diferenças entre si — como os Yanomami, Macuxi, Xirixana, Taurepang, Sapara, Ye’kuana, Wai Wai e Wapichana. Todos contribuíram para eleger Joênia em 2018.
“É preciso fazer com que os indígenas também representem os não indígenas, assim como os brancos fizeram muito tempo com a gente. É preciso transcender a pauta para direitos humanos, combate à corrupção etc”, afirmou a deputada Joênia Wapichana.
Visando a ampliar a competitividade das candidaturas indígenas, Joênia se encontrou recentemente com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Edson Fachin, no fim de março. Ela pediu ao ministro um empenho maior da Corte para fornecer urnas e informações às comunidades indígenas afastadas.
A trajetória de Sônia Guajajara na política também explicita o novo momento do movimento indígena. Em 2018, ela concorreu à vaga de vice na chapa presidencial de Guilherme Boulos (PSOL) para ganhar visibilidade. Agora, faz os cálculos de quantos votos precisa para se eleger deputada por São Paulo (cerca de 40 mil) e cobra os presidentes partidários por mais espaço e recursos nas campanhas.
“Somente o voto indígena não elege ninguém”, afirmou ela, enfatizando que a luta por demarcação de terras também representa uma luta pela preservação das florestas e do equilíbrio climático, que entrou na pauta dos Parlamentos do mundo.
Montado na última semana em Brasília, o acampamento Terra Livre, que reuniu mais de 7 mil indígenas de 200 povos diferentes, contou com uma tenda específica para o cadastro de títulos eleitorais. O evento teve neste ano a sua edição mais politizada, com o slogan “Aldear a Política”, e com a presença do ex-presidente Lula (PT) e da ex-ministra Marina Silva (REDE).
Os pré-candidatos indígenas admitem que ainda são vistos dentro dos partidos, mesmo nos de esquerda, como peças para preencher a cota eleitoral de raça e não como candidaturas competitivas.
“Visibilidade importa, mas eu não quero só chegar de cocar para mostrar que os partidos são diversos. Quero um apoio que se concretize no objetivo, que é estar lá e fazer leis”, disse a codeputada Chirley Pankará (PSOL-SP), que tentará uma vaga na Alesp.
Famoso na Câmara, o primeiro deputado indígena do Brasil, o cacique Mário Juruna, se celebrizou pelo discurso antipolítica e quase foi cassado por chamar os ministros de “ladrões e sem-vergonha”. A impressão que os pré-candidatos indígenas querem passar agora é justamente a contrária: não serem mais vistos como “personagens folclóricos”, mas como a nova cara do Congresso brasileiro.
– Antes de qualquer outro movimento, os indígenas deveriam tentar libertar-se das suas atuais lideranças, que nunca se preocuparam realmente com a questão dos Povos Originários. Davi Kopenawa, Cacique Raoni e outros do mesmo naipe gostam mesmo é da paparicação e das mordomias dos convescotes internacionais. Vendem os indígenas, em US dólares e Euros, como massa de manobra às ONGs internacionais, biopiratas que polulam por toda a Amazônia, enquanto os residentes das malocas (leia-se comunidades), morrem de béri-béri, malária, etc. As comunidades indígenas que têm se transformado em polos produtores de fruti-hortigranjeiros, tornando-se independentes têm desagradado a esses manipuladores por estarem desenvolvendo uma nova mentalidade de ideal e capacidade. Isso, sim, precisa ser feito, antes de querer ocupar grandes espaços no cenário político nacional, para evitar que elementos de secundários, ocultos e escusos interesses se locupletem, como tem ocorrido até agora.