O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) alertou que a condição dos povos indígenas Yanomami e Ye’kwana já era caótica antes da pandemia, “agora a situação é ainda mais grave, ocorrendo o risco real de genocídio.”
Órgão de estado, que tem na sua composição instituições do governo e da sociedade, fez o diagnóstico ao STF (Supremo Tribunal Federal) após ser instado a se manifestar sobre o plano emergencial do governo de combate à pandemia da covid-19 entre os povos indígenas.
No documento de 44 páginas, o CNDH acusa o governo de Jair Bolsonaro de apresentar um plano “deveras genérico, não apontando sequer a disponibilidade orçamentária que será necessária para garantir as medidas apontadas”.
“A situação de violação de direitos humanos sofrida pelos povos indígenas Yanomami e Ye’kwana é muito grave, havendo risco iminente à vida desses povos indígenas em virtude de grande presença de garimpeiros na Terra Indígena”, destacou o CNDH.
De acordo com a instituição, a situação é tão grave que a Hutukara Associação Yanomami e o CNDH ingressaram com pedido de medida cautelar junto à CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos).
O CNDH ressalta alguns pontos contraditório do governo federal. No tocante aos Yanomami, a União anuncia: o reestabelecimento das bases de proteção; fiscalização e repressão ao garimpo ilegal; e desenvolvimento de operações por equipes interinstitucionais.
No entanto, requer no TRF1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) a suspensão de uma ação civil pública proposta pelo MPF (Ministério Público Federal) para retirada dos invasores daquela região, alegando a ação em andamento no STF.
“Parece contraditória a postura da União ao asseverar que irá iniciar o plano de desintrusão pela TIY e, na citada ACP, pugnar pela suspensão do processo que visa à proteção dos povos indígenas”, diz o conselho.
Segundo o órgão, considerando as especificidades da situação dos povos indígenas Yanomami e Ye’kwana, buscando a prevenção de um verdadeiro genocídio, é fundamental que a União desista do pedido de suspensão do processo realizado nos autos da citada ação civil pública.
Desintrusão
Para o conselho, é urgente a retirada dos invasores de sete Terras Indígenas na Amazônia: Karipuna e Uru-Eu-Wau-Wau (RO); Kayapó, Munduruku e Trincheira Bacajá (PA); Araribóia (MA); e Yanomâmi (AM/RR).
Considerada a maior do Brasil (9 mil hectares no Amazonas e Roraima), a TI Yanomâmi tem infiltrado no seu território cerca de 20 mil garimpeiros.
“A desintrusão das Terras Indígenas nunca foi tão necessária e urgente. A presença de não-indígenas nos territórios representa risco à saúde dos povos indígenas, risco de contágio da Covid-19”, alertou.
Além disso, os invasores também limitam o direito de uso da terra pelos indígenas para a busca e cultivo de alimentos, medicamentos naturais e coleta de materiais relevantes para a construção e manutenção de suas aldeias, da sua infraestrutura de convivência comunitária.
“Tolerar a ocupação de terras por não indígenas implica, necessariamente, em negar aos povos indígenas as terras imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias à sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições”, diz o documento citando o artigo 231 da Constituição.
STF
O ministro do STF Luís Roberto Barroso deu um prazo até o dia 7 de setembro para o governo Bolsonaro apresentar uma nova versão do plano para combater a pandemia da Covid-19 entre os povos indígenas.
O ministro determinou a correção no âmbito da ação da Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) em conjunto com seis partidos políticos (PSB, PSOL, PCdoB, Rede, PT, PDT), deliberação já referendada pelo plenário da corte.
Para tomar a decisão, Barroso tomou também como base as manifestações do CNDH. Além de apresentar os pontos falhos do plano governamental, o conselho apontou quais ações seriam necessárias para que efetivamente seja levado a cabo um plano de proteção
As recomendações apresentadas pelo conselho ao STF trataram da assistência integral e diferenciada; execução orçamentária; participação social e controle social; terras para a saúde indígena, demarcação dos territórios e barreiras sanitárias, moratória aos grandes projetos (mineração e energia); proteção social; e desintrusão de invasores de terras indígenas.
Para o presidente do CNDH, Renan Sotto Mayor, o conselho cumpre um papel fundamental ao auxiliar na efetividade do direito à saúde dos povos indígenas, que tanto tem sofrido com a Covid-19.
“Espera-se que as recomendações elaboradas na manifestação, construídas coletivamente pelo grupo de trabalho criado no âmbito do conselho, sejam acolhidas pela União”, afirmou.