O líder indígena Davi Kopenawa Yanomami enviou, na última quinta-feira, 31, uma carta aos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pedindo urgência no julgamento do processo que pode cassar o mandato do governador de Roraima, Antonio Denarium (PP-RR). No documento, o xamã afirma que o Estado “vive um momento de profunda instabilidade política e social” e alerta para o agravamento da crise humanitária na Terra Yanomami, causada pelo avanço do garimpo ilegal “amplamente documentado durante o atual governo estadual”.
Na carta, Kopenawa questiona a demora do julgamento e compara a lentidão do processo de Denarium com a celeridade de outros casos, como o do governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL-RJ), julgado pela Corte na terça-feira, 4. “Causa apreensão o fato de que outros processos […] tenham sido rapidamente pautados, enquanto o caso de Roraima segue sem desfecho. Essa disparidade é motivo de grande preocupação”, diz um trecho da carta.
Xamã e liderança reconhecida internacionalmente, Davi Kopenawa reiterou que a morosidade do TSE representa risco à segurança do povo Yanomami, que enfrenta mortes, desnutrição, contaminação dos rios e destruição ambiental provocadas pela atividade garimpeira.
Não é a primeira vez que o cacique se manifesta sobre o tema. Em vídeo divulgado recentemente, Kopenawa dirigiu-se à ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) e presidente do TSE, Cármen Lúcia, pedindo que ela interceda junto ao Governo de Roraima e impeça o retorno dos garimpeiros ilegais ao território indígena.
“Senhora Cármen, eu estou aqui em Brasília pedindo sua força. [Antônio Denarium] parece uma pessoa boa, mas a alma dele não é boa. Eu queria que a senhora chamasse a atenção dele para não deixar e não apoiar a volta do garimpeiro ilegal à Terra Yanomami. Isso não é bom para o meu povo”, declarou o xamã.
Em 2024, Davi Kopenawa e Cármen Lúcia se encontraram no Palácio do Planalto, em Brasília. O líder aproveitou a ocasião para relatar a situação de vulnerabilidade enfrentada pelos Yanomami e pedir apoio institucional da magistrada.
Além da pressão sobre o TSE, Kopenawa também tem cobrado respostas do governo federal. Em declaração em outubro deste ano, ele afirmou que promessas feitas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) não vêm sendo cumpridas. Segundo o xamã, a falta de médicos, medicamentos e infraestrutura de saúde continua provocando mortes por malária, diarreia e outras doenças evitáveis.
“O Ministério da Saúde e a Sesai não deram respostas efetivas para conter a mortalidade infantil. É preciso uma ação imediata, com planejamento e execução coordenada entre os órgãos federais e estaduais”, disse o líder indígena.
Entenda o processo
O julgamento de Antônio Denarium no TSE trata de um recurso contra a decisão do Tribunal Regional Eleitoral de Roraima (TRE-RR), que cassou a chapa do governador e do vice, Edilson Damião, por abuso de poder econômico e político nas eleições de 2022.
O governador de Roraima, Antonio Denarium, e o vice, Edilson Damião, realizam entrega das cestas básicas (Reprodução/Facebook/Antonio Denarium)
As denúncias apontam uso de programas sociais, como Morar Melhor, Cesta da Família e Renda Cidadã, para obter vantagem eleitoral, além da transferência de R$ 70 milhões a municípios às vésperas do período proibido pela legislação e gastos irregulares com publicidade institucional.
Enquanto o julgamento segue sem desfecho no TSE, Denarium e Damião permanecem no cargo. O TRE-RR também decretou a inelegibilidade de ambos por oito anos.
Leia a carta enviada por Davi Kopenawa Yanomami aos ministros do TSE:
“Assunto: Urgência no julgamento do processo contra o governador Antonio Denarium
Boa tarde, Excelentissimos Ministros do Tribunal Superior Eleitoral,
Roraima vive um momento de profunda instabilidade política e social. O atual governador, Antonio Denarium, já foi cassado quatro vezes pelo Tribunal Regional Eleitoral de Roraima, e o processo aguarda julgamento definitivo neste Tribunal Superior, ainda sem previsão para inclusão em pauta.
Causa apreensão o fato de que outros processos, como o do governador do Rio de Janeiro, Claudio Castro, tenham sido rapidamente pautados — inclusive após recentes operações policiais — enquanto o caso de Roraima segue sem desfecho.
Essa disparidade é motivo de grande preocupação, especialmente diante da gravíssima crise humanitária vivida pelo Povo Yanomami, marcada por mortes, desnutrição, contaminação de rios e destruição ambiental em consequência do avanço do garimpo ilegal, amplamente documentado durante o atual governo estadual.
E difícil compreender por que, mesmo diante de um cenário de violações de direitos humanos reconhecidas nacional e internacionalmente, este processo permanece sem julgamento definitivo. A demora acentua o sofrimento de comunidades inteiras e compromete a confiança da sociedade roraimense na Justiça Eleitoral.
Em nome do Povo Yanomami e de todos os que defendem a vida, a democracia e os direitos humanos em Roraima, apelamos respeitosamente para que o julgamento do governador Antonio Denarium seja pautado e concluído com a urgência que a gravidade do caso exige.
Atenciosamente,
Davi Kopenawa Yanomami
Liderança Yanomami
Boa Vista (RR), 31 de outubro de 2025
Davi Kopenawa yanomami”









