Causa de manifestações de povos indígenas em todo o país, a PEC 48, tratada por eles como “PEC da Morte”, é uma proposta do senador por Roraima, Dr. Hiran (Progressistas). Após a derrubada da tese do Marco Temporal pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no ano passado, o senador por Roraima resolveu tentar aprovar uma nova lei que pudesse de alguma maneira reparar a decisão do STF, com a desculpa de que estaria fazendo justamente o oposto: trazendo segurança jurídica a um tema já esgotado pelo Supremo. Com a aprovação da nova lei, Hiran Gonçalves pretende encontrar meios para que terras indígenas, hoje sob a proteção do Estado, possam ser exploradas.
O que é marco temporal?
É uma tese jurídica segundo a qual os povos indígenas teriam direito apenas às terras que já ocupavam ou já disputavam antes da promulgação da Constituição de 1988. Essa tese surgiu em 2009, em parecer da Advocacia-Geral da União sobre a demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima, quando esse critério foi usado.
O Supremo Tribunal Federal entendeu, em setembro 2023, que essa tese não era justa, pois não trazia a segurança necessária do direito à terra para os povos originários, e derrubou a ideia, sendo esta considerada inconstitucional pela Suprema Corte.
A partir daí é que o senador por Roraima apresentou o projeto de Lei nº 14.701/2023, em tentativa de reverter o impacto da decisão do STF, para atender ao grupo que acredita que o melhor a se fazer é explorar os recursos das terras em questão.
Em entrevista a um veículo local, esta semana, o senador Dr. Hiran disse que a nova lei, se aprovada, servirá para dar segurança ao homem do campo, e ainda disse que a PEC é “anseio de todos os brasileiros”, argumento que pode ser facilmente desmentido pelo termômetro na própria página da PEC 48 no Senado, com as assinaturas populares:
A Articulação dos Povos Indígenas apresentou 25 reivindicações durante os manifestos, dentre elas, a publicação de portaria declaratória de 12 Terras Indígenas (TIs), a retirada de tramitação e arquivamento definitivo das Propostas de Emenda à Constituição que desconstitucionalizam os direitos indígenas, a exemplo da PEC de Dr. Hiran, e declaração imediata da inconstitucionalidade da Lei proposta pelo senador, para “conter as violências, a criminalização e os assassinatos de liderança indígenas”.
O que Dr. Hiran pretende com isso?
Criando uma nova lei para que novamente seja levada em consideração a data de ocupação das terras em até 5 outubro de 1988, ele abre precedentes para a retirada de terras que hoje são dos povos indígenas. Com isso, ele atenderia aos interesses de fazendeiros, parceiros políticos que têm propriedades próximas de áreas indígenas atualmente preservadas.
Em Roraima, é sabido que os maiores produtores do agronegócio são parceiros e correligionários de Dr. Hiran, a exemplo do próprio governador Antonio Denarium (Progressistas), que é o maior produtor de carne e de soja do estado. Mas a desculpa usada pelo senador é de que “o Brasil já tem muita terra indígena demarcada”.
“[A PEC 48] é uma aspiração do povo brasileiro, porque a gente está vendo no campo que essa nossa indecisão gera invasões, gera conflitos. Temos indígenas atacando produtores. Nós temos invasão de terra em vários lugares desse país porque não temos um marco legal adequado para proteger as populações”, afirmou.
Com a aprovação da PEC da morte, Dr. Hiran pretende fazer com que sejam retiradas diversas terras da jurisdição pró-indígena para que elas possam ser exploradas de outras formas, ao invés de sua preservação natural. A exemplo da expansão do agronegócio e do garimpo.
Os indígenas continuam se manifestando em Roraima, em Brasília, no Amazonas e em em outros estados do país. Eles pedem reunião com o senador por Roraima mas não foram atendidos até agora.