"A queda do Céu", documentário que também foi exibido em Cannes. Frame: reprodução

Depois de uma estreia emblemática em Cannes, “A Queda do Céu” foi premiado como Melhor Longa-Metragem Documentário no Festival Internacional de Guanajuato, no México. Dirigido por Gabriela Carneiro da Cunha e Eryk Rocha, o filme concorreu com outros 7 filmes estrangeiros, produzidos nos Estados Unidos, França, Bélgica, Paquistão, Qatar, Hungria, Chile, Alemanha e Irlanda. O anúncio foi feito no dia 28 de julho, em uma cerimônia realizada no Teatro de la Ciudad, em Irapuato.

A justificativa apresentada pelo júri ressaltou a qualidade das produções documentais em disputa: “Por favor, considere isso uma honra extraordinária, pois a competição foi acirrada e o júri desta categoria, composto por Juliana Fanjul, Elena Fortes e Steve Holmgren, apresentou padrões muito elevados”. Ainda assim, a coprodução Brasil-Itália se destacou pela sensibilidade da narrativa: “Eles decidiram premiar seu filme pela urgência da mensagem, pela paisagem sonora envolvente e pela profunda experiência visual, além do profundo respeito e confiança com o povo Yanomami.”

Antes de chegar ao Brasil, o longa tem outras passagens marcadas pelo mundo. Selecionado para a mostra competitiva do Festival de Lima, que acontece em agosto, o filme terá sua primeira exibição sulamericana em um dos principais eventos cinematográficos do continente. Ainda este ano, a produção também participa do Melbourn.

“A Queda do Céu” teve sua primeira exibição na Quinzena de Cineastas, mostra paralela de Cannes voltada para o cinema marcado pelo risco e autoralidade. A sessão aconteceu no dia 19 de maio, com a presença dos diretores e dos autores do livro que inspirou o filme: o xamã Yanomami Davi Kopenawa, um dos maiores líderes indígenas do mundo, e o antropólogo francês Bruce Albert. Assim como o público presente, que aplaudiu de pé a produção, os veículos estrangeiros foram cativados pela potência da narrativa apresentada pela primeira vez no evento francês.

O roteiro é centrado na festa Reahu, ritual funerário e a mais importante cerimônia dos Yanomami, que reúne centenas de parentes dos falecidos com a finalidade de apagar todos os rastros daquele que se foi e assim colocá-lo em esquecimento. A partir de três eixos fundamentais do livro (Convite, Diagnóstico e Alerta), o filme apresenta a cosmologia do povo Yanomami, o mundo dos espíritos xapiri, o trabalho dos xamãs para segurar o céu e curar o mundo das doenças produzidas pelos não-indígenas, o garimpo ilegal, o cerco promovido pelo povo da mercadoria e a vingança da Terra. Produzido pela Aruac Filmes, o filme é uma coprodução Brasil-Itália, da Hutukara Associação Yanomami e Stemal Entertainment com Rai Cinema, e de Les Films d’ici.

O diretor Eryk Rocha entende a função do filme em mostrar a relação entre os povos Yanomami e os napë (os não-indígenas). “O nosso desejo no filme é de que a cultura yanomami seja vista como uma cultura viva, contemporânea e florescente, mas também que a cultura napë veja a si mesma a partir de uma perspectiva xamânica e de uma geopolítica contracolonial”, explica o cineasta. A diretora Gabriela Carneiro da Cunha complementa: “O longa é a expressão cinematográfica do arrebatamento que tivemos ao ler o livro. Mas principalmente da nossa relação e do que foi vivido em carne, osso e espírito ao longo dos últimos sete anos ao lado de Davi, da comunidade Watorikɨ e dos Yanomami. É um filme onde a câmera não olha só para os Yanomami, mas para nós não-indígenas também. E isso sempre foi um fundamento do filme tanto para mim quanto para Eryk. Trabalhamos para fazer um filme que expressasse a materialidade onírica de uma relação”, explica.

Sinopse

A partir do poderoso testemunho do xamã e líder Yanomami Davi Kopenawa, o filme “A Queda do Céu” acompanha o importante ritual, Reahu, que mobiliza a comunidade de Watorikɨ num esforço coletivo para segurar o céu. O filme faz uma contundente crítica xamânica sobre aqueles chamados por Davi de povo da mercadoria, assim como sobre o garimpo ilegal e a mistura mortal de epidemias trazidas por forasteiros que os Yanomami chamam de epidemias “xawara”, e traz em primeiro plano a beleza da cosmologia Yanomami, dos espíritos xapiri e sua força geopolítica que nos convida a sonhar longe.

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