O ex-presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), pediu “desculpas” aos garimpeiros ilegais por deixar de regulamentar a atividade, enquanto liderou o Brasil de 2019 a 2022. A declaração foi dada ao podcast Papo de Redação, do jornal Folha de Boa Vista, em entrevista concedida na quarta-feira, 27. Bolsonaro culpou a pandemia de Covid-19 por atrasar a discussão sobre a liberação do garimpo em terras indígenas e disse não acreditar que o Governo Lula coloque o assunto em pauta.
“Peço desculpa aos garimpeiros. Tivemos dois anos perdidos para a Covid-19; não pudemos levar para frente uma melhor proposta nesse sentido, mas o garimpeiro tem que ser reconhecido”, defendeu Bolsonaro. Durante o mandato do ex-presidente, entre 2019 e 2022, a atividade garimpeira em terras indígenas, que é proibida por lei, teve grande crescimento, sobretudo, na Terra Yanomami, em Roraima, e provocou uma grave crise sanitária no território indígena.
Foi no contexto da pandemia que o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Sales afirmou que Bolsonaro deveria aproveitar o momento e passar com ‘a boiada’ e ‘mudar’ regras ligadas à proteção ambiental e à área de agricultura e evitar críticas e processos na Justiça.
A declaração foi feita por Sales em reunião ministerial restrita cujo sigilo foi quebrado pelo então ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Celso de Mello. O registro era analisado para saber se Jair Bolsonaro interviu politicamente na Polícia Federal.
Para ele, a mineração não deveria ser uma atividade exclusiva de grandes empresas, especialmente, as internacionais que atuam no Brasil. “O garimpo, não é fácil falar isso aí, porque passei pela presidência, o pessoal cobra: ‘ah, passou e não fez nada’. Tivemos dois anos perdidos no Brasil com a pandemia”, afirmou.
Bolsonaro não respondeu, claramente, sobre qual seria a proposta que possibilitasse a mineração sem destruir o meio ambiente, mas afirmou que sua ideia seria que o Estado tivesse o parecer de quanto produz e que a riqueza nacional beneficiasse o próprio País. “A minha ideia não é apenas comprar ouro, mas também acertar a questão de minérios de ouros, minerais preciosos para que o trabalho de lapidação fique aqui no Brasil”, complementou.
O ex-presidente anunciou que estará em Roraima em fevereiro de 2024, depois do Carnaval, e prometeu reunir o público na Praça do Centro Cívico, onde está localizado o Monumento do Garimpeiro, para agradecer a “estrondosa” votação que recebeu em Roraima em 2022. “Se tiver na reta final da minha vida política, quem sabe aí [vou] morar em Roraima e me despedir um dia nessa terra que eu tanto admiro, tanto amo, e tanto gosto desta região”, declarou.
Durante a entrevista, o ex-presidente também desferiu ataques ao Governo Lula, criticou a ampliação de áreas federais de conservação ambiental, disse que a crise entre Venezuela e Guiana, em torno da disputa pelo território guianense de Essequibo, deve ser tratada por cortes internacionais, elogiou o ditador Nicolás Maduro sobre fazer referendo com voto impresso, e avaliou que o País vizinho não tem condições de voltar a fornecer energia para abastecer Roraima.
Crise Humanitária
O avanço do garimpo ilegal na Terra Yanomami, maior território indígena do País, provocou crise humanitária, sanitária e de saúde no território. Mais de 20 mil garimpeiros invadiram a terra indígena e chegaram a regiões antes intocadas, como Auaris, quase na fronteira com a Venezuela.
O garimpo e a desassistência em saúde indígena, no Governo Bolsonaro, levaram a uma explosão de casos de malária, desnutrição grave, infecções respiratórias e outras doenças associadas à fome, como diarreia. Desde o dia 20 de janeiro, a região está em emergência de saúde pública.
Em meio à crise, o governador de Roraima e aliado de Bolsonaro, Antonio Denarium (Progressistas), defendeu ao jornal Folha de São Paulo uma assimilação cultural dos indígenas Yanomami. Ele propôs que os indígenas “não podem mais ficar no meio da mata parecendo bicho”.
Em outro trecho da mesma entrevista, Denarium minimizou a desnutrição dos indígenas e disse que não era possível vincular o garimpo de ouro à situação dos Yanomami. Por conta das declarações, o Ministério Público Federal (MPF) abriu inquérito para apurar responsabilidade cível do governador roraimense.
Além das ações de emergência em saúde, o Governo Lula deu início à “Operação Libertação“ para combater o garimpo ilegal no território Yanomami. A operação está prevista para durar de seis meses a um ano e ocorre por meio de ações de patrulhamento, revista de pessoas, veículos terrestres, embarcações e aeronaves e de prisões em flagrante delito.