Por decisão emitida pela 3ª Vara do Trabalho de Boa Vista, pertencente ao Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (AM/RR), os montantes resultantes de um processo movido pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) contra uma empresa de aviação serão direcionados para ações humanitárias voltadas ao povo Yanomami, situado em Roraima.
Em 19 de julho, a juíza do Trabalho Substituta da 3ª Vara de Boa Vista, Vanessa Maia de Queiroz Matta, autorizou a transferência de R$ 74,1 mil para as contas da Fundação Ajuri de Apoio ao Desenvolvimento. Além disso, o juízo da 3ª VT de Boa Vista também determinou a alocação adicional de R$ 101,5 mil para a mesma entidade, totalizando assim R$ 175,5 mil em prol das comunidades indígenas dessa região.
Os valores devem ser repassados à Fundação Ajuri, entidade responsável pelos projetos de desenvolvimento social da Universidade Federal de Roraima (UFRR). A Ajuri será responsável por juntar, nos autos, um relatório parcial de execução do projeto de defesa e promoção dos Direitos Humanos do povo Yanomami no Estado de Roraima, a cada três meses.
A decisão do TRT-11 adverte que eventual desvio de finalidade poderá implicar na incidência da lei de improbidade (Lei 8.429/1992) “e demais sanções civis e criminais”. O MPT justificou a escolha da Fundação da Ajuri diante da urgência em dar atenção à situação de calamidade dos indígenas, já amplamente divulgado pela imprensa. O órgão mantém cadastro de projetos de entidades sociais e beneficentes, com comprovada regularidade fiscal e previdenciária. O TRT-11, por sua vez, acatou a indicação do Ministério Público.
Entenda o caso
Os valores repassados à Fundação Ajuri decorrem de um processo iniciado em fevereiro de 2018 pelo Ministério Público do Trabalho da 11ª Região, em Roraima, ao constatar que a empresa Norteagro Norte Aeroagrícola operou com aeronaves em situação irregular, colocando em risco pilotos, funcionários e a sociedade local. A empresa, que trabalha com pulverização aérea em lavouras, usou aeronaves com o Certificado de Aeronavegabilidade (CA) vencido, de acordo com relatório da Agência Nacional de Aviação (ANAC).
Para o MPT, a empresa atuava com a falta de revisões técnicas e manutenções preventivas, ocasionando exposição dos pilotos e outros empregados “ao risco constante de acidentes aeronáuticos, além de causar-lhes transtornos psicológicos irreparáveis”. O MPT apresentou proposta de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), a qual foi rejeitada pela empresa.
A Norteagro também não aceitou a proposta de pagar indenização de reparação por danos morais coletivos no valor de R$ 300 mil. Os procuradores, então, solicitaram à Justiça do Trabalho uma tutela inibitória para que a empresa fosse impedida de continuar voando enquanto estivesse em situação de irregularidade.
Acordos não cumpridos
O TRT-11 atendeu ao pedido, mas a empresa recorreu levando o caso para a tentativa de um acordo em abril de 2018. Pelo acordo realizado, a Norteagro depositaria R$ 30 mil em dez parcelas por indenização de danos coletivos.
A empresa informou, no decorrer dos meses subseqüentes ao acordo, os pagamentos das parcelas, até outubro de 2018. Porém, em fevereiro de 2019, o MPT acusou a ausência de comprovação do pagamento. Houve nova audiência de conciliação em 2020, para a regularização das duas últimas parcelas. Mas, novamente, a Norteagro não quitou a dívida.
Em abril de 2021, o MPT se manifestou pedindo uma auditoria das aeronaves para averiguar se a empresa ainda operava com as irregularidades, mesmo após o acordo com a Justiça do Trabalho. As irregularidades foram confirmadas. Expirado o prazo para a Norteagro comprovar o pagamento das parcelas em atraso, o TRT-11 decidiu pelo bloqueio de R$ 59,7 mil, em fevereiro de 2022.
Em fevereiro de 2023, os advogados da Norteagro procuraram o TRT-11 para firmar acordo, informando que a empresa estava sob nova administração. Em abril deste ano, em audiência telepresencial na 3ª VT de Boa Vista, o MPT e a empresa chegaram a um acordo. As duas parcelas em débito foram corrigidas pelos índices da Justiça do Trabalho.