Foto: Marley Lima/ SupCom ALE-RR

A decisão da Assembleia Nacional da Venezuela de nomear novos membros para o Conselho Nacional Eleitoral ameaça um sistema já injusto. Essa medida diminui ainda mais a possibilidade de que as eleições presidenciais de 2024 e as legislativas e regionais de 2025 sejam livres e justas.

Em 15 de junho de 2023, o presidente da Assembleia Nacional, Jorge Rodríguez, disse que substituirá todos os 15 membros do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), que incluía dois membros da oposição entre os seus cinco membros principais. A decisão foi tomada depois que oito membros do Conselho, que estavam alinhados com o governo, renunciaram cinco anos antes do final de seus mandatos de sete anos, deixando novas indicações para a Assembleia Nacional, controlada pelo governo. A assembleia rapidamente nomeou uma comissão de 11 membros que inicialmente conduzirá o processo para substituir os membros do Conselho. Todos os membros da comissão pertencem ao Partido do governo, incluindo Cilia Flores, esposa do presidente Nicolás Maduro.

“As chances de eleições livres e justas na Venezuela já estavam por um fio, e essa manobra pode tornar isso praticamente impossível”, disse Juanita Goebertus, diretora da Human Rights Watch para as Américas. “Lideranças políticas regionais com acesso a Maduro, particularmente o presidente colombiano Gustavo Petro e o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, deveriam tomar medidas para impedir essa manobra se realmente estão preocupados com qualquer perspectiva de retorno da Venezuela à democracia.”

O Conselho Eleitoral, composto por cinco membros principais e dez suplentes, é responsável pela supervisão de todo o processo eleitoral, incluindo o registro de eleitores e a inscrição de candidaturas, assim como a organização e supervisão dos procedimentos de votação.

De acordo com a lei venezuelana, a recém formada comissão de 11 membros será encarregada de designar um Comitê de Nomeações Eleitorais, que, por sua vez, apresentará uma lista de candidatos para a Assembleia Nacional. A coalizão governista passou a controlar mais de 250 dos 277 assentos na Assembleia após as eleições legislativas de 2020 que não foram livres ou confiáveis.

Durante décadas, aliados do ex-presidente Hugo Chávez e de Maduro têm controlado o órgão eleitoral, minando o direito a eleições livres e justas. Em 2021, a composição do Conselho Eleitoral tornou-se um pouco mais equilibrada, com a nomeação de dois membros da oposição. Um acordo com o Conselho permitiu que uma missão da União Europeia (UE) monitorasse as eleições de novembro de 2021. A missão disse que os três membros do Conselho próximos ao governo estavam “no controle dos órgãos executivos da CNE”, mas observou que o Conselho era “amplamente visto como o mais equilibrado dos últimos 20 anos” e que a maioria de suas decisões era por consenso.

A missão da UE concluiu que várias condições prejudicaram a imparcialidade e a transparência das eleições de 2021. Essas condições incluíram a desqualificação arbitrária de oponentes políticos, o uso partidário de recursos estatais em campanhas, o acesso desigual aos meios de comunicação e às redes sociais durante a campanha, o bloqueio de sites por autoridades e a falta de independência judicial e de respeito ao Estado de Direito.

A missão emitiu 23 recomendações, incluindo o fortalecimento da capacidade do Conselho Eleitoral de impor sanções aos candidatos e candidatas que utilizem fundos estatais para fazer campanha de forma ilegal e a melhora da precisão do registro de eleitores, bem como a oferta de mais opções para eleitores, incluindo os venezuelanos que vivem no exterior, para atualizar suas informações.

Em 2021, o governo de Maduro e a oposição concordaram que, como parte de suas negociações políticas no México, eles discutiriam “direitos políticos”, “garantias eleitorais para todos” e um cronograma eleitoral. No entanto, as negociações estão paradas e as partes ainda não abordaram estes assuntos.

Um Conselho Eleitoral totalmente controlado pelos aliados de Maduro tornaria muito improvável a implementação das reformas necessárias para garantir o direito da população venezuelana de participar de eleições livres e justas, disse a Human Rights Watch.

O processo de nomeação de novos membros já afetou as primárias da oposição, programadas para outubro. Alguns membros da oposição vinham trabalhando para obter o apoio do CNE para a realização de suas primárias, mas, após as renúncias, a oposição decidiu “autogerenciar” as primárias.

Os presidentes Petro, da Colômbia, e Lula, do Brasil, têm mantido acesso próximo ao governo de Maduro. Publicamente, ambos os líderes enfatizaram a importância da democracia, de eleições livres e justas e do progresso nas negociações políticas entre o governo de Maduro e a oposição. Mas durante uma recente visita de Maduro ao Brasil, o presidente Lula descreveu as preocupações com o autoritarismo e a falta de democracia na Venezuela como “uma narrativa”.

“A pequena janela de oportunidade para uma transição democrática que garanta os direitos dos venezuelanos está se fechando”, disse Goebertus. “Se Lula e Petro querem que seu discurso sobre democracia na Venezuela tenha alguma credibilidade, deveriam, com urgência, aproveitar seu relacionamento com Maduro para evitar uma cooptação total do órgão eleitoral do país.”

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