A Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) divulgou uma nota técnica no início do segundo semestre de 2022, alertando os governos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e do estado de Roraima sobre a crescente contaminação de peixes capturados nos rios formadores da bacia do Rio Branco.
Conforme o documento, encaminhado para o UOL pela Fiocruz, os peixes analisados no estudo apresentaram altos índices de contaminação pelo mercúrio utilizado nos garimpos de ouro, sobretudo no interior da terra indígena Yanomami.
Os animais foram adquiridos diretamente com os pescadores nos pontos em que ocorre o desembarque pesqueiro ou ainda nas embarcações antes do desembarque, entre os dias 27 de fevereiro de 2021 e 06 de março de 2021.
As amostras de pescado foram coletadas em quatro pontos selecionados, na bacia do Rio Branco: Baixo Rio Branco; Baixo Rio Mucajaí, afluente da margem direita do Rio Branco; Rio Branco na cidade de Boa Vista; e Rio Uraricoera, no município de Amajari. Em seguida, o material recolhido foi enviado para análise dos níveis de mercúrio no Instituto Evandro Chagas (IEC), em Belém, no Pará.
No IEC foi constatado que a ingestão de metilmercúrio excede os limites preconizados pela ONU (Organização das Nações Unidas) para a Alimentação e a Agricultura (FAO/WHO) em praticamente todos os cenários hipotéticos estudados.
Ainda de acordo com o levantamento realizado pela Fiocruz, a ingestão de metilmercúrio, proveniente do consumo de pescado contaminado, por mulheres em idade fértil em Roraima é de 2 a 9 vezes maior do que os limites estabelecidos pela FAO/WHO.
Para as crianças de 5 a 12 anos e para as crianças menores de 5 anos, a ingestão de metilmercúrio é aproximadamente 4 a 18 vezes, e 8 a 32 vezes superior aos limites seguros estabelecidos pela FAO/WHO.
As análises apontaram que somente homens adultos, com baixo consumo de pescado (até 50 gramas por dia), estão livres de riscos à saúde decorrentes da exposição crônica ao metilmercúrio.
Ao divulgar a nota técnica, a Fiocruz emitiu algumas recomendações para os governos à época. Entre elas, a interrupção imediata das atividades ilegais de garimpo nas terras indígenas de Roraima, além da retirada dos invasores das terras da União; a elaboração de um plano de descontinuidade do uso de mercúrio na mineração de ouro no Brasil; e estruturar um Plano de Manejo de Risco (PMR) para as populações cronicamente expostas ao mercúrio.
Com base no estudo, estimou-se que 45% do mercúrio usado em garimpos para extração de ouro à época era despejado em rios e igarapés da Amazônia, sem qualquer tratamento ou cuidado.
A Fiocruz alertou, ainda, que devido ao elevado tempo de persistência nesses sistemas aquáticos, o mercúrio pode permanecer disponível no meio ambiente por até cem anos, e com isso, pode provocar diversas doenças em adultos e crianças.
A nota é de autoria de pesquisadores da Fiocruz, do Instituto Socioambiental, do Instituto Evandro Chagas e da Universidade Federal de Roraima.