Em decreto publicado em 1º de janeiro, o governo Lula oficializou a criação do Ministério dos Povos Indígenas, o primeiro na história da política nacional a ser dedicado exclusivamente às demandas indígenas. A pasta será comandada pela deputada federal eleita em 2022 Sônia Guajajara. Nascida e criada na Terra Indígena (TI) Arariboia, no Maranhão, a parlamentar é a primeira ministra indígena do Brasil.
Também passam integrar a pasta dois importantes órgãos que até então estavam vinculados ao Ministério da Justiça e Segurança Social: a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), o maior órgão de política indigenista do país desde 1967, e o Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI), criado em 2015 por Dilma Rousseff para garantir a participação de representantes dos povos indígenas na formulação de políticas públicas. Enquanto a Funai perdeu suas funções no governo anterior, o CNPI foi extinto pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.
“Colocar a Funai dentro do Ministério dos Povos Indígenas é reconhecer a necessidade de aproximar as políticas indigenistas à realidade dos povos indígenas e de incluí-los nos processos de decisão política”, afirma o coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Kleber Karipuna.
Além da Funai e do CNPI, a pasta é formada por três secretarias – além da Secretaria-Executiva – e sete departamentos, sendo eles:
Secretaria de Direitos Ambientais e Territoriais Indígenas, formada pelos departamentos de Demarcação Territorial e de Proteção Territorial e de Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato; Secretaria de Gestão Ambiental e Territorial Indígena, formada pelos departamentos de Justiça Climática e o de Gestão Ambiental, Territorial e Promoção ao Bem Viver Indígena; Secretaria de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas, formada pelos departamentos de Promoção da Política Indigenista e de Línguas e Memórias Indígenas; Departamento de Mediação e Conciliação de Conflitos Fundiários Indígenas, que não está vinculado a nenhuma secretaria
Retomada da Funai e da política de demarcação
Um dos coordenadores do grupo de trabalho de povos indígenas do governo de transição de Lula, Karipuna afirma que o foco do ministério indigenista será a retomada das demarcações de terras indígenas, política paralisada nos quatro anos do governo de Jair Bolsonaro.
“A demarcação de terras é a principal demanda do movimento indígena brasileiro desde antes da Constituição Federal de 1988. A pauta ganhou força depois do texto da Constituição, que garantiu o direito de termos nossas terras demarcadas, mas essa política não foi efetivamente implementada até hoje”, diz Karipuna.
O Brasil tem 722 terras indígenas conhecidas. Todas elas deveriam ter sido demarcadas até 1993, segundo a Constituição Federal, mas apenas 487 foram homologadas (quando o processo de demarcação é concluído).
Além de abandonar a política de demarcação territorial, o governo Bolsonaro tentou submeter a Funai ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), então comandado pela ministra Tereza Cristina, parlamentar egressa representante da bancada ruralista. Uma decisão do Supremo Tribunal Federal, contudo, julgou a ação inconstitucional e a Funai permaneceu no Ministério da Justiça e Segurança Pública, porém sem suas funções essenciais, como a demarcação de terras.
Com a criação do Ministério dos Povos Indígenas, a Funai recupera suas funções. O órgão também passa a ser presidido por uma indígena, a deputada federal Joenia Wapichana.
Além da Funai, a política de demarcação de territórios indígenas do ministério também conta com o Departamento de Demarcação Territorial, que analisará os processos de demarcação encaminhados pela Funai. Também caberá ao departamento promover ações de fiscalização e desintrusão nos territórios indígenas, acompanhando eventuais reintegrações de posse.
“Sabemos que retomar a demarcação de terras indígenas será um enorme desafio para o país, já que não depende somente de vontade política, também precisamos garantir que essa política indigenista seja incluída no orçamento da União”, pondera Karipuna.