O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria pela suspensão da lei que instituiu um piso salarial nacional a profissionais da enfermagem. Com o voto do ministro Gilmar Mendes, a Corte se posicionou com o placar de 6 a 2 a favor da decisão do relator Luís Roberto Barroso que suspendeu, por 60 dias, os efeitos da lei em que enfermeiros passariam a receber um salário mínimo inicial de R$ 4.750, em serviços de saúde públicos e privados.
A liminar de Barroso atendeu a uma ação ajuizada pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e Estabelecimentos e Serviços (CNSaúde).
De acordo com a liminar, a lei que estabelece o piso foi suspensa até que sejam esclarecidos os impactos da medida sobre a situação financeira de estados e municípios. A decisão cobra apuração dos riscos financeiros e à empregabilidade da categoria, tendo em vista as alegações de que pode haver demissões em massa. Além disso, há a preocupação com a qualidade dos serviços, pelo risco alegado de fechamento de leitos e de redução nos quadros de enfermeiros e técnicos.
Em seu voto, Gilmar Mendes afirmou que a aprovação do piso prejudicaria setor público e privado, que entidades filatrôpicas, como as santas casas, não seriam beneficiadas nem mesmo por desoneração da folha pelo governo, pois já possuem incentivos fiscais.
O magistrado apontou o risco de demissões no setor privado, em razão dos custos. “Também chamo a atenção para que se leve na devida conta que políticas como a do caso presente geram consequências nefastas no setor privado que frontalmente vulneram o princípio da segurança jurídica: externalidades negativas como o muito provável aumento de demissões de profissionais da enfermagem”, escreveu Gilmar.
Além do ministro Gilmar, acompanharam o relator Luís Roberto Barroso, os ministros Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Cármen Lúcia. O julgamento no plenário virtual do STF começou na última sexta-feira (9) e os magistrados têm até a próxima sexta (16) para apresentar seus votos.
Votos divergentes
Os ministros André Mendonça, Kassio Nunes Marques e Edson Fachin se posicionaram contra a decisão de Barroso. Os votos de Mendonça e de Nunes Marques foram divulgados pelo Supremo no domingo (11). No entendimento dos ministros, o Judiciário não deve interferir em decisão tomada por outro poder da República — o piso salarial da enfermagem surgiu a partir da aprovação de um projeto de lei no Congresso Nacional e foi sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL).
Já o outro voto divergente, o do ministro Edson Fachin, foi divulgado nesta segunda-feira (12). Para ele, é certo que a preocupação em reduzir o desemprego deve ser vista como um objetivo nacional. No entanto, para Fachin, as manifestações de diversas entidades representativas dos trabalhadores parecem apontar que essa preocupação foi levada em consideração quando a lei foi elaborada.
“No presente caso, são os próprios titulares dos direitos fundamentais sociais, ou seja, os trabalhadores, que reclamaram a norma exaustivamente debatida no Congresso Nacional”, afirmou Fachin em seu voto. “Nada justifica, teórica ou empiricamente, que esta Corte Suprema tenha melhores condições de definir o que os próprios representantes do povo, com a reivindicação da sociedade civil organizada em diversas etapas do processo legislativo, deliberaram,” complementou.
Ação da Confederação Nacional de Saúde
Após o piso entrar em vigor, o STF foi acionado pela Confederação Nacional de Saúde (CNSaúde), que pediu ao Tribunal que declare a lei inconstitucional. A entidade explica que a norma que criou o piso desrespeita a auto-organização financeira, administrativa e orçamentária de estados e municípios tanto por repercutir sobre o regime jurídico de seus servidores quanto por impactar os hospitais privados contratados pelos entes para realizar procedimentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
O piso salarial da enfermagem contempla enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem e parteiros. De acordo com a lei, a remuneração mínima de técnicos de enfermagem seria de 70% do piso nacional dos enfermeiros (R$ 3.325), enquanto o salário inicial de auxiliares de enfermagem e parteiros corresponderia a 50% do piso dos enfermeiros (R$ 2.375).
A liminar do ministro Barroso determina que entidades privadas, públicas e de terceiro setor se manifestem dentro de dois meses. Após isso, ele deve tomar nova decisão sobre o caso e o tema pode voltar ao plenário da corte para decisão definitiva.