O Observatório do Clima, coalizão que reúne as maiores ONGs do país, lançou na tarde de hoje o primeiro volume de um relatório onde detalha suas propostas para reverter a política ambiental implantada pelo governo Bolsonaro nos últimos três anos e meio. Coordenado pela ex-presidente do Ibama, Suely Araújo, o documento inicial tem 73 recomendações o próximo governo reverter a situação que qualifica de “desmantelamento” da governança ambiental do país.
O relatório se divide em medidas para serem adotadas em até 100 dias e outras que requerem 2 anos para implementação. As mudanças mais imediatas, que são em sua maioria aplicáveis por meio de decretos e normas do Executivo, incluem em grande partes medidas administrativas, como a recriação do PPCDAM (Programa de Prevenção e Controle do Desmatamento da Amazônia) e a recomposição das cadeiras para a sociedade civil no Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) e o descongelamento do fluxo de recursos do Fundo Amazônia.
O documento lista também ações diplomáticas, como o ajuste de metas do Brasil para redução das emissões de gases do efeito estufa, de forma a evitar que as metas do país para 2025 e 2030 percam ambição em relação ao que fora prometido no Acordo de Paris para o clima.
O relatório lista e até medidas mais específicas, como realizar uma operação de retirada de garimpeiros da terra indígena Yanomami, em Roraima.
No texto divulgado hoje, os especialistas detalham ações dentro de um projeto de escopo maior, batizado de “Brasil 2045”, que parte do pressuposto de que o país pode se tornar uma “potência ambiental”. Na visão do grupo, o terrotório brasileiro tem potencial para se tornar não apenas uma zona que absorve mais carbono do que emite.
O relatório teve a participação de técnicos das principais ONGs da coalizão, incluindo Greenpeace, WWF, Transparência Internacional e SOS Mata Atlântica. Est documento listando ações de curto e médio prazo será seguido de outros, que listarão de maneira mais específicas revogações e políticas públicas que requerem prazo maior.
Araújo diz que distribuiu cópias do relatório a equipes de campanha de todos os pré-candidatos a presidente da república nesta manhã, com exceção daquela do candidato à reeleição, Jair Bolsonaro. Segundo as ONGs (que também incluem instituições de pesquisa, como Imazon e IPAM), a derrota de Bolsonaro é uma “pré-condição” para que as propostas listadas façam sentido.
“Não existe politica ambiental na prática, no governo Bolsonaro. Eles vêm destruindo a política ambiental nos últimos três anos e meio e não têm a mínima intenção de construção” afirma a advogada e urbanista. “No caso de ocorrer a reeleição, o esforço maior será o de contenção para eles não terminem o serviço de aniquilar com a política ambiental, que tem sido um projeto de destruição bem sucedido até agora”.
Araújo lidera dentro do OC um programa que busca com ações no poder judiciário a contestação de medidas consideradas nocivas para o meio ambiente e o clima.
Amazônia ‘sem lei’
A reimplementação do PPCDAM é listada como uma das prioridades do próximo governo, porque não depende muito do poder legislativo para andar rápido. A situação na Amazônia hoje, porém, requer mais poder de polícia para atuação dos fiscais contra o desmatamento.
“Antes desse governo já ocorriam problemas de grilagem e o nível de ilicitude do desmatamento sempre foi alto, mas a Amazônia virou agora uma terra sem lei, porque o governo agora estimula invasões públicas e garimpo ilegal desmatamento sem controle — diz Araújo”. Hoje a violência e os conflitos sociais estão numa situação bem pior do que 2003, quando o PPCDAM foi concebido e colocado em vigor.
Um dos pontos destacados no relatório do Observatório do Clima é o aumento da transparência para fiscalização do desmatamento e da extração ilegal de madeira, que hoje têm sistemas de monitoramento fechados ao público. Suely defende, por exemplo, que sejam divulgados CPFs e CNPJs de proprietários de terras com desmate ilegal no CAR (Cadastro Ambiental Rural).
Com essas e outras ferramentas, incluindo as das guias de transporte de gado e grãos, seria possível rastrear a cadeia produtiva de commodities para evitar que elas saiam de terras com desmate recente.
“Será muito difícil, por exemplo, zerar o desmate sem esse tipo de atuação. Só chutando porteira de fazenda, nunca vai ter fiscais suficiente para isso”. diz a advogada. “Nós precisamos usar cada vez mais a publicização das informações publicas e deixar tudo isso aberto, porque a sociedade também ajuda a controlar”.