Senadora Damares Alve. Foto: Clarice Castro/MMFDH.

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) divulgou nota de repúdio pelo discurso do governo brasileiro no Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). Segundo a entidade, o pronunciamento foi distorcido e esconde o quadro de violações de direitos. De acordo com o Cimi, o discurso feito pela ministra Damares Alves “é descolado da realidade e um desrespeito aos povos indígenas”.

Os dados divulgados pela ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, por exemplo, traz uma “contagem limitada”, sob um “critério equivocado”, afirma o conselho. “O vírus que chegou às aldeias e provocou inúmeras mortes foi levado para dentro dos territórios indígenas, em sua grande maioria, por invasores que seguem atuando ilegalmente nestas áreas em plena pandemia, livres das ações de fiscalização e proteção do governo”, diz a nota.

O que Damares chama de “regularização fundiária”, afirma ainda a entidade, “trata-se na verdade de titulação privada de invasores de terras protegidas e de territórios indígenas, o que vem estimulando ainda mais o desmatamento na Amazônia e demais biomas”. Invasões, exploração ilegal e danos ao patrimônios cresceram sob o atual governo, que também bate recordes de desmatamento.

A sessão do Conselho de Direitos Humanos, aberta hoje, vai até 1º de abril. Representantes dos povos originários no Brasil estão participando, com denúncias sobre aumento da violência e a “política anti-indígena” do atual governo.

Leia a íntegra da nota.

 

O Conselho Indigenista Missionário – Cimi repudia o discurso do Brasil durante o Segmento de Alto Nível, que abre a 49ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, com dados distorcidos e descolados do real quadro de violações de direitos dos povos indígenas. O pronunciamento do estado brasileiro foi realizado pela ministra de Estado da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, na manhã desta segunda-feira, 28 de fevereiro.

A Ministra afirmou que 85% da população indígena foi vacinada, refere-se a uma contagem limitada, sob o critério equivocado de “indígenas aldeados, ou seja, aqueles que vivem nos territórios demarcados, ignorando que seu próprio governo paralisou o processo de demarcações e os indígenas em contextos urbanos. Na verdade, o governo vem promovendo um apagão de dados sobre a Covid-19 e não pode dar certeza da porcentagem apontada. O vírus que chegou às aldeias e provocou inúmeras mortes foi levado para dentro dos territórios indígenas, em sua grande maioria, por invasores que seguem atuando ilegalmente nestas áreas em plena pandemia, livres das ações de fiscalização e proteção do governo.

Em muitas aldeias, a pandemia levou as vidas de anciões e anciãs que eram verdadeiros guardiões da cultura, da história e dos saberes de seus povos, representando uma perda cultural inestimável – não só para os povos indígenas diretamente afetados, mas para toda a humanidade. Segundo dados da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), mais de 68 mil indígenas foram contaminados pela Covid-19 e pelo menos 1.283 morreram por complicações da doença até 28 de fevereiro de 2022.

A chamada “regularização fundiária” aduzida pela Ministra Damares, trata-se na verdade de titulação privada de invasores de terras protegidas e de territórios indígenas, o que vem estimulando ainda mais o desmatamento na Amazônia e demais biomas. Em 2020 proliferaram os casos de “invasões possessórias, exploração ilegal de recursos e danos ao patrimônio” aumentaram, em relação ao já alarmante número que havia sido registrado no primeiro ano do governo Bolsonaro. Foram 263 casos do tipo registrados em 2020 – um aumento em relação a 2019, quando foram contabilizados 256 casos, e um acréscimo de 137% em relação a 2018, quando haviam sido identificados 111 casos. Este foi o quinto aumento consecutivo registrado nos casos do tipo, que em 2020 atingiram pelo menos 201 terras indígenas, de 145 povos, em 19 estados.

Outra inverdade do discurso é o da proteção da Amazônia. O governo Bolsonaro, na realidade, bate recordes anuais consecutivos de desmatamento, desde 2019, quando assumiu o governo. Em janeiro de 2022 o desmatamento da Amazônia foi de 360 km², quatro vezes mais que o equivalente ao ano passado. As invasões e os casos de exploração de recursos naturais e de danos ao patrimônio registrados em 2020 repetem o padrão identificado no ano anterior. Os invasores, em geral, são madeireiros, garimpeiros, caçadores e pescadores ilegais, fazendeiros e grileiros, que invadem as terras indígenas para se apropriar ilegalmente da madeira, devastar rios inteiros em busca de ouro e outros minérios, além de desmatar e queimar largas áreas para a abertura de pastagens.

Em muitos casos, os invasores dividem a terra em “lotes” que são comercializados ilegalmente, inclusive em terras indígenas habitadas por povos isolados. O caso dos povos Yanomami, Ye’kwana e Munduruku exemplifica a estreita relação entre a ação dos invasores, a omissão do Estado e o agravamento da crise sanitária, com o aumento expressivo dos casos de malária e desnutrição relacionados com a presença de invasores em seus territórios. Na Terra Indígena Yanomami, onde é estimada a presença ilegal de cerca de 20 mil garimpeiros, os invasores devastam o território, provocam conflitos, praticam atos de violência contra os indígenas e, ainda, atuam como vetores do coronavírus – num território onde há também a presença de indígenas em isolamento voluntário.

Ademais, o Estado brasileiro age para enfraquecer a governança indígena e ambiental brasileira, com a propositura do Projeto de Lei 191/2020 e o apoio ao Projeto de Lei 490/2007 que legisla a tese inconstitucional do marco temporal. Também opera a iniciativa de enfraquecimento dos direitos indígenas com a Instrução Normativa (IN) 09/2020 da Fundação Nacional do Índio (Funai), a Instrução Normativa Instrução Normativa 01/2021, expedida pela Funai, em conjunto com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – Ibama e a Resolução 04, de 22 de janeiro de 2021, fazendo parte de um pacote normativo que ameaça os povos indígenas e o meio ambiente.

Recentemente, o governo também publicou um Decreto estabelecendo o Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Mineração Artesanal – Pró-Mape, que visa “estimular” a garimpagem “com vistas ao desenvolvimento sustentável”, o programa prevê um incentivo ao garimpo na região amazônica, em um momento de evidente expansão da atividade sobre os territórios indígenas com seríssimas consequências para a saúde e a vida dos povos indígenas. Além de nenhuma Terra Indígena ter sido demarcada pelo governo Bolsonaro”

O discurso do Estado brasileiro na 49ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, é descolado da realidade e um desrespeito aos povos indígenas. A versão equivocada da atual política brasileira de direitos humanos não pode prosperar nos foros multilaterais, principalmente no Conselho de Direitos Humanos da ONU. O Cimi segue atento às violações dos direitos indígenas e juntos aos povos indígenas seguirá denunciando as atrocidades do atual governo.

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