O decreto do presidente Jair Bolsonaro (PL) para apoiar a mineração artesanal vai criar uma corrida ilegal pelo ouro na Amazônia e impulsionar novos casos de uso de balsas como o que ocorreu no rio Madeira, diz o Greenpeace.
Nesta segunda-feira (14), o governo federal publicou dois decretos sobre mineração. Um deles apresenta o Pró-Mapa (Programa de Apoio ao Desenvolvimento da Mineração Artesanal e em Pequena Escala).
“O decreto diz aos garimpeiros: não temam, vou regularizar vocês. Essa mensagem vai na contramão do dever da PF [Polícia Federal] de combater o garimpo, por exemplo. Mas não tinha como criticar a PF ou pará-la. Aí tem de legalizar o que é ilegal”, diz Danicley Aguiar, porta-voz da campanha Amazônia do Greenpeace.
Bolsonaro é um antigo defensor do garimpo e tem os garimpeiros como apoiadores. Entretanto, foi criticado após a ação no rio Madeira, em dezembro, quando mais de cem balsas foram destruídas pelo Ibama e PF.
No dia da ação, deputados chegaram a se reunir com integrantes do governo para interromper a ação. Um dos argumentos usados era que os garimpeiros praticavam a mineração artesanal.
Nesta segunda, em nota, a Secretaria-Geral da Presidência disse que o Pró-Mapa “inaugura uma nova perspectiva de políticas públicas sobre a atividade garimpeira no Brasil”. Para o Greenpeace, porém, o decreto vem em um contexto de disputa eleitoral em que Bolsonaro quer acenar para a sua base eleitoral.
Segundo Aguiar, atualmente, com o uso de tecnologia, o impacto do garimpo aumentou. Ele cita o exemplo de balsas, como as vistas no rio Madeira, para argumentar que não há muita diferença entre o pequeno e o grande garimpeiro.
“Há um debate de que essas atividades que se desenrolam com dragas de R$ 1 milhão em balsas, com escavadeiras hidráulicas, poderiam ser enquadradas como atividade artesanal. A maioria das pessoas que entende da legislação sabe que isso não se encaixa”, afirma.
Para o Greenpeace, essa sinalização de que esse tipo de garimpo pode ser legalizado é o principal impacto do decreto.
“O sujeito que estava pensando em investir no garimpo, mas tinha medo da PF ou do Ibama, vai colocar dinheiro porque pensa que Bolsonaro vai legalizar. O impacto é muito mais político-psicológico. Ele vai estimular uma onda, uma corrida ao ouro ilegal, estimular que novos garimpos sejam abertos, novas balsas sejam colocadas na água”, diz ele.
O Instituto Escolhas, associação sem fins lucrativos que debate a sustentabilidade, também se manifestou contra os decretos em nota e pediu a revogação dos atos de Jair Bolsonaro.
“Com esses dois decretos, o volume de ouro com indícios de ilegalidade, que já ultrapassa as 200 toneladas, tende a crescer, abalando ainda mais a credibilidade do país, que não tem como provar a origem do ouro que exporta”, diz trecho do documento.
A entidade afirma que os decretos estimulam o garimpo e vai contribuir para aumentar os impactos negativos da atividade na região amazônica.
“Significa que os garimpos que operam de forma ilegal terão um arcabouço institucional para seu funcionamento. Ou seja, ao invés de fiscalizar e por fim aos garimpos ilegais, o governo está abrindo um espaço institucional para que essas atividades se tornem legais”, diz o instituto.
Ex-diretor da ANM (Agência Nacional da Mineração), o advogado Tomás de Paula Pessoa Filho defende os decretos editados pelo governo.
Para ele, atualmente, não há qualquer diferenciação e a “mineração artesanal é submetida às mesmas regras e critérios, mesmo tendo impacto menor que o da grande mineração”.
“Portanto, a busca por regularização e o desenvolvimento da atividade era mais que esperado — principalmente em um setor que gera riquezas e favorece nossa balança comercial positiva”, afirma.
Além do decreto da mineração artesanal, o governo publicou outro texto que mira as regras da ANM para análise dos processos de outorga.
Os ambientalistas afirmam que o texto afrouxa as regras e tem por objetivo atender a interesses estrangeiros reunidos em diretrizes da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).
A OCDE autorizou o início da negociação para entrada do Brasil no grupo dos países ricos e, na semana passada, emitiu recomendação em seus relatórios sobre a mineração no país.
Segundo o ex-diretor da ANM, os decretos de Bolsonaro “atendem bem” às recomendações sobre como deve ser tratada a atividade no país.