O Ministério Público Federal (MPF) em Roraima recomendou a suspensão imediata do plano de aproximação com o povo indígena isolado Yanomami, que vive no estado. Em sua decisão, a procuradora da República Manoela Lopes Cavalcante recomenda que os órgãos “abstenham-se de promover ações terrestres e/ou aéreas nas imediações da comunidade isolada Moxihatëtëa, na Terra Indígena Yanomami, evitando-se contato com esta”, devendo respeitar as normas específicas para o processo de eventual contato com esses povos isolados.
“As referidas ações junto à comunidade isolada Moxihatëtëa somente poderão ser excepcionalmente admitidas, em caso de necessidade extrema decorrente de demonstrado risco real a tais povos”, afirma a procuradora.
O MPF lembra ainda que a recomendação “dá ciência e constitui em mora os destinatários quanto às providências solicitadas, podendo a omissão na sua adoção implicar o manejo de todas as medidas administrativas e ações judiciais cabíveis contra os que se mantiverem inertes”.
Questionada sobre o assunto, a Fundação Nacional do Índio (Funai) declarou que foi realizada uma reunião no Dsei Yanomami com o coordenador do órgão, Anderson Andrade Vasconcelos, e que este informou que a aproximação de helicóptero, como estava planejada, não é sua atribuição.
Por meio de nota, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), vinculada ao Ministério da Saúde, declarou que “não estão programados sobrevoos do Ministério da Saúde sobre a terra indígena Yanomami ou qualquer outra população isolada” e que “toda e qualquer ação de saúde junto a indígenas isolados seguirá estritamente os protocolos já estabelecidos para estes povos”.
Como mostrou a reportagem, o Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi) pretende fazer, em abril, um sobrevoo com helicóptero sobre a terra indígena yanomami. O objetivo, segundo o presidente do Condisi, Júnior Hekurari Yanomami, é verificar possíveis casos de contaminação por malária e a proximidade de garimpeiros e madeireiros desses grupos isolados.
“A ideia é sobrevoar, ver quais as situações desses isolados, se estão no mesmo local que já identificamos ou não”, disse Júnior, em reportagem publicada nesta segunda-feira. “Sabemos que eles estão próximos de uma região endêmica de malária, além de estarem próximos a garimpos”, comentou.
A ideia não agradou o líder yanomami Davi Kopenawa. “Sou contra isso. Podem espalhar doenças. E se descerem na terra indígena? Não pode. Eu mesmo sou yanomami e nunca estive com os isolados, porque respeito o espaço deles e trabalho para defender a escolha e a vida deles”, disse Kopenawa. O líder yanomami perdeu a mãe por contaminação de sarampo, após contato feito por não índios.
Segundo o Conselho Distrital de Saúde Indígena, há registros de que haveria cerca de 80 índios isolados vivendo na região. Eles estariam próximos de comunidades da terra indígena yanomami que já viveram surtos de malária. “No ano passado, uma comunidade yanomami da região teve 200 casos de malária”, disse Júnior. Uma equipe de médicos e técnicos foi enviada para dar tratamento aos indígenas.
Sobrevoos sobre locais habitados por povos isolados são práticas evitadas, porque podem gerar estresse e levar os índios a abandonarem suas casas. Por regra, a localização dessas malocas deve ser mantida em sigilo, como forma de preservar a escolha do próprio indígena, que pretende viver isolado. Para garantir esse isolamento, a Funai monta bases distantes, delimitando e fiscalizando áreas que não podem ser acessadas.