As duas foragidas de Roraima que foram presas em São Paulo na manhã desta quinta-feira (20) por tráfico de drogas e associação criminosa desempenham um relevante papel de comando no PCC, conforme aponta relatório de investigação da Polícia Federal ao qual a reportagem teve acesso. Mayara Mikele da Silva, apelidada de “Imperatriz”, e Sthefany Stron, chamada de “Daniele”, ambas de 27 anos, “exercem uma forte ascendência sobre as demais faccionadas” baseadas no Estado.
Diálogos interceptados comprovaram, de acordo com a PF, que Mayara compartilhava com Sthefany o comando da ala feminina da facção em Roraima e Região Norte do país, o que foi corroborado por diversas investigadas no Estado que informaram saber da atuação dela, identificando, inclusive, seu apelido (Imperatriz) e sua “responsabilidade” dentro da organização criminosa. Algumas a identificaram ainda como “madrinha”.
Uma das depoentes descreveu à polícia que seu “batismo” ocorreu por telefone. Membros da facção sediados em São Paulo a incluíram na organização. No dia em que foi “batizada”, ela chegou a ser questionada pela madrinha se realmente queria integrar o PCC “de corpo, alma e coração”. A jovem aceitou e passou a atuar como “geral do estado” desde outubro de 2019, função para a qual foi escolhida “em razão de sua forma de trabalhar passando boas informações para a madrinha”.
De acordo com as funções do crime organizado, “geral dos estados”, também chamado de “torres”, é um conselho formado por cinco pessoas, sendo uma delas superior as outras quatro. Elas exercem posição de liderança entre os membros da facção e estabelecem contatos com as demais “gerais” existentes em outros presídios e nas ruas. Entre as suas atribuições, estão também transmitir informações e criar normativas e diretrizes de procedimento, bem como o controle e a disciplina dos integrantes que se encontram presos e aqueles que estão em liberdade.
A jovem destacou no interrogatório que sua madrinha morava em São Paulo e, durante os processos de punição, fazia questão de acompanhar a execução por telefone. De acordo com a depoente, a tortura só parava quando a chefe mandava. Ela disse ainda que se recorda de uma pessoa apelidada de “Danielle”, apontada pelas investigações como a parceira de Mayara “Imperatriz” no crime.
Operações após atentados
As investigações da Polícia Federal, com monitoramento permanente da atuação do PCC em Roraima, resultaram nas operações Érebo, realizada em novembro de 2018, e na Hipaspistas, em julho de 2019, que tiveram, respectivamente, o objetivo de desarticular lideranças regionais da facção e impedir a consolidação de lideranças no Estado.
Com as apurações, iniciadas em 2017, a PF identificou e mapeou a estrutura da organização criminosa no Estado. “Os elementos angariados em inquérito policial permitiram a identificação dos mentores responsáveis pelos diversos atentados que ocorreram em Roraima entre 29 e 31 de julho de 2018, além do cometimento de outros crimes, principalmente o de participação em organização criminosa, tráfico de drogas e associação para o tráfico”, destacou a Federal à época.
No período, foram realizados ataques a diversos órgãos públicos e empreendimentos particulares em vários municípios do Estado, inclusive a uma delegacia de polícia e a um destacamento da PM, além de bancos.
O monitoramento dos líderes na região permitiu que a PF, em parceria com outros órgãos de segurança pública do Estado – a Polícia Militar e a Divisão de Inteligência e Captura (Dicap) da Secretaria de Justiça de Roraima – impedisse o acontecimento de outros atentados planejados pelos investigados, destacando-se o incêndio do pátio onde ficam os ônibus de transporte coletivo de Boa Vista e a destruição dos veículos e maquinários envolvidos com a coleta e o processamento de lixo. Foi impedida, também, uma fuga em massa da Penitenciária Agrícola de Monte Cristo programada para 29 de julho de 2018.
As ordens para os atentados partiram de dentro da Pamc e foram dadas após a autorização do responsável pela organização no Estado, que se encontrava preso no Presídio Estadual de Piraquara, no Paraná.
Funções no crime
Apesar das duas operações deflagradas, a PF constatou o fortalecimento de outros setores da facção e um dos quadros em destaque foi o setor feminino, que apresentou considerável aumento nas atividades em razão da menor exposição de seus integrantes, predominantemente, mulheres. Nas investigações, ficou constatado que a organização criminosa utiliza a menor exposição das “irmãs” para execução de diversas atividades importantes.
“A facção centraliza importantes ações de apoio ‘na feminina’, de forma a minimizar os graves riscos a que, ordinariamente, os integrantes masculinos estão sujeitos. Cita-se, a título de exemplo, o controle e guarda de drogas e armas de fogo. Destaca-se que as faccionadas centralizam algumas atividades vinculadas ao registro e ao controle dos diversos dados produzidos pelo PCC”, cita trecho do relatório da PF, ressaltando haver ainda o crescente envolvimento de integrantes do sexo feminino em execuções promovidas pela facção, após as chamadas conduções dos “condenados” pela organização.
Diante de novas informações, a PF conseguiu identificar as principais lideranças femininas do PCC no Estado, com destaque para Mayara “Imperatriz” e Sthefany “Danielle”, que estavam baseadas em São Paulo e eram responsáveis por conduzir toda a ala feminina do PCC no Norte do Brasil. Além das duas mulheres presas, no apartamento em que elas estavam em Guarulhos (SP) foi preso um foragido desde 2019 do sistema prisional paulista. Também foram expedidos 13 mandados de busca e apreensão.
Os mandados de prisão preventiva de Mayara Mikele da Silva e Sthefany Stron foram expedidos pela Vara de Entorpecentes de Organizações Criminosas de Boa Vista. Elas também estavam sendo procuradas por condenações em Mato Grosso do Sul, de onde fugiram, havia cerca de um ano, para São Paulo.
Além das prisões pelos mandados anteriormente expedidos, os três foram presos por tráfico de drogas e associação para o tráfico. No imóvel onde eles estavam, foram encontrados porções de cocaína e de maconha, diversos celulares e quase R$ 13 mil. Todos foram conduzidos à Superintendência da Polícia Federal.