Lideranças indígenas de varias partes do Brasil estão se mobilizando contra a Medida Provisória 870/2019 que transferiu da Funai para o Ministério da Agricultura a atribuição de identificar, delimitar, demarcar e registrar as terras tradicionalmente ocupadas pelos povos indígenas.
Representações já foram entregues em diversas unidades do Ministério Público Federal pelo país e a mesma demanda já foi apresentada à Câmara de Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais do MPF (6ª Câmara) em Brasília.
O cacique do povo Potiguara, Sandro Gomes, explicou o que preocupa os indígenas com a transferência da demarcação das terras do Ministério da Justiça para o Ministério da Agricultura: “É muito preocupante porque no Ministério da Agricultura só tem ruralistas e nunca mais vai ter uma terra demarcada”. Para o cacique geral, tirar a Funai do Ministério da Justiça representa um enfraquecimento total da instituição e também dos indígenas, “porque a Funai, mesmo com a decadência, tinha um poder de polícia”, explicou.
O procurador do Ministério Público Federal, José Godoy, que também atua como representante da 6ª Câmara, entende que a divisão que foi feita não atende aos ditames jurídicos e ao que determinam as normas sobre a questão, a Constituição Federal e tratados dos quais o Brasil é signatário.
“O Brasil assinou um tratado internacional de direitos humanos que estabelece que haverá consulta aos povos indígenas e tribais sempre que uma política pública lhe afetar diretamente, e a Medida Provisória 870/2019 distribuiu a matéria indígena em três ministérios, retirando uma competência da Funai, que vem desde o século passado, de acompanhar as terras indígenas, e colocando a fundação em um ministério [da Agricultura] que não tem nenhum expertise, nenhuma experiência e nem pessoal capacitado para realizar demarcações”, argumenta.
O procurador também chama a atenção para o fato de que as terras indígenas são bens públicos: “Quando tratamos de terras indígenas, tratamos de patrimônio da União, de bens públicos que pertencem ao povo brasileiro. A partir do momento que o governo abdica de demarcar essas terras, o governo abdica de patrimônio do povo brasileiro”, explica José Godoy, acrescentando que essas terras possuem valores muito altos.
Conforme as representações, os indígenas pedem ao MPF que instaure inquérito civil para investigar e monitorar os atos e processos administrativos de demarcação de terras indígenas que vão tramitar no âmbito do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e também para apurar eventual responsabilidade que atente contra a moralidade administrativa, a democracia e ofensa aos direitos culturais dos povos indígenas.
Pedem ainda que sejam tomadas medidas urgentes para evitar dano irreparável aos povos indígenas, pela suspensão ou interferência política em procedimentos demarcatórios atingidos por ato de integrantes do Ministério da Agricultura.
Nossa equipe tentou falar com representantes do Ministério da Agricultura para tratar sobre a questão indígena enfocada acima, mas não foi possível se estabelecer contato até o fechamento desta reportagem.