A equipe do presidente eleito Jair Bolsonaro prepara um decreto que irá rever a criação da reserva indígena Raposa Serra do Sol. A área estende-se por uma área de 1,7 milhão de hectares no Estado de Roraima e foi homologada em 2005. O decreto faz parte de um pacote de medidas de impacto que o futuro governo anunciará nos primeiros dias após a posse do presidente e que inclui também outras ações imediatas na área ambiental. “Temos que desatar esse nó que entrava o desenvolvimento do Brasil”, afirmou ao Valor um assessor do presidente eleito.
Embora não seja a maior reserva indígena do país – esse posto é do Parque Indígena do Xingu – Raposa Serra do Sol é emblemática e estratégica do ponto de vista do novo governo. Isso porque retomar as atividades produtivas em áreas até hoje preservadas é o cerne da nova política que Bolsonaro quer implementar em seu governo, promovendo a ampliação das fronteiras agrícolas. O próprio presidente eleito costuma dizer em pronunciamentos sobre o tema que “o Brasil não suporta ter mais de 50% do território demarcado como terras indígenas, como áreas de proteção ambiental, como parques nacionais, porque isso atrapalha o desenvolvimento”.
Roraima, que tem mais de dois terços do território ocupado por áreas de proteção ambiental e reservas indígenas, segundo assessores do presidente eleito, é tido como um exemplo dos problemas causados por uma política ambientalista descompromissada com o crescimento e desenvolvimento do país. O Estado vive uma crise sem precedentes, não consegue pagar os servidores que paralisaram suas atividades em todos os setores inclusive na segurança, e está sob intervenção federal até o dia 31. A situação é ainda agravada pela entrada dos imigrantes venezuelanos que fogem das dificuldades no país vizinho.
O território demarcado foi alvo na década passada de uma disputa judicial entre a União, o Estado de Roraima e produtores de arroz que chegaram à região por volta da década de 70. Apoiados pelo governo estadual, os arrozeiros – que segundo estatísticas da época chegavam a produzir mais de 150 mil toneladas de arroz ao ano – queriam que a demarcação excluísse as partes da área que eram cultivadas. Esses trechos seriam desmembrados e formariam espécies de ilhas na Reserva.
Mas, em 2009, decisão final do Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou, por 10 votos a favor e um contra, a demarcação contínua da Terra Indígena Raposa Serra do e manteve a homologação decretada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, determinando a retirada dos não indígenas da região.
“Em tese, a demarcação pode ser revista e um novo decreto editado. Não há precedentes, mas é possível. Assim como, certamente, haverá uma nova contestação que acabará no Supremo Tribunal Federal”, explicou ao Valor o ministro Marco Aurélio Mello, o único voto contra a demarcação contínua no julgamento de 2009.
Quase dez anos após a decisão do STF, a área onde hoje estima-se que vivam aproximadamente 17 mil índios das etnias Macuxi, Wapixana, Ingarikó, Taurepang e Patamona, virou, segundo fontes do governo de transição, um descampado onde nada se produz e cresce todo tipo de ilícitos. O território da Raposa é considerado um tesouro em recursos hídricos e minerais que atraem o garimpo clandestino, muitas vezes comandado pelos próprios índios. Existem jazidas de nióbio, metal leve empregado na siderurgia, aeronáutica, espacial e nuclear, que podem chegar a ter 14 vezes todo o metal conhecido no planeta, e a segunda maior reserva de urânio do planeta.
Além de ouro, estanho, diamante, zinco, caulim, ametista, cobre, diatomito, barita, molibdênio, titânio e calcário. “Temos que reverter o paradigma da resistência ambiental que serve de fachada aos interesses internacionais por nossas riquezas que aqui se fazem representar pelas Organizações Não Governamentais (Ongs)”, justifica um integrante do grupo de transição.
Assessores do governo de transição já têm um levantamento que inclui cerca de 300 Ongs de preservação ambiental e defesa dos direitos indígenas, boa parte delas ligadas a entidades internacionais. Eles citam o Conselho Indígena de Roraima (CIR), que é a filial brasileira da Amazon Aliance, e recebe o apoio de entidades como o a Norueguesa Norad, a britânica Oxfam, The Nature Conservancy e o Greenpeace. “Eles não querem dar à população brasileira o direito de usar seus recursos e nós vamos acabar com isso”, diz um desses assessores.