Foto: acervo pessoal.

A história dos rallys náuticos ganhou, no fim do mês passado, um dos seus capítulos mais importantes. Isso porque o grupo Araguaia Jet, com sede em Barra do Garças (MT), fez história ao percorrer 6 mil quilômetros a bordo das motos aquáticas, em um trajeto que começou nas águas do rio Branco, em Boa Vista, e se encerrou no rio Araguaia, na casa dos ‘jeteiros’.

Daniel Vilella (27), Vinícius Castro (30), Fabrício Carvalho (38), Anderson Torres (38), Weverton Sousa (39), Roberto Sacchetti (45) e Moacir Couto Filho (48) partiram de Boa Vista, capital de Roraima, na fronteira com a Venezuela, rumo à Barra do Garças, no Mato Grosso, em 2 de agosto — uma viagem que durou nada menos do que 23 dias.

Roberto Sacchetti, Vinicius Castro, Fabrício Carvalho, Moacir Couto, Anderson Torres, Daniel Vilella e Weverton Sousa, a equipe do Araguaia Jet. Foto: Arquivo pessoal

A jornada, contudo, foi muito além dos recordes na água e abriu novos horizontes não só a cada um dos quase 30 rios percorridos, mas, principalmente, na percepção de vida dos sete aventureiros. Afinal, ao longo do caminho, o grupo se deparou com muito mais do que belas águas e lindas paisagens.

Como o Araguaia Jet começou

Barra do Garças abriga a Serra do Roncador, conhecida por ser um local místico, com portais que levam a outros mundos. Moacir Couto, um dos integrantes do Araguaia Jet, nunca atravessou um desses portais, mas ainda assim encontrou em Barra do Garças um outro universo, do qual não abre mão: o das águas.

“Eu sou a apaixonado por isso. As águas, o rio… eu tenho uma identificação muito grande”, conta.

E a paixão vem de berço. Sua mãe, como ele mesmo diz, “é nascida na beira do rio Araguaia”, assim como ele. Morar em uma cidade banhada pelo rio, que dispõe de mais de 2000 km de curso, fez com que, desde a infância, os barcos e as canoas já se fizessem presentes — mas o sonho mesmo era o jet.

“A gente ainda andava de barco, canoa, mas sempre sonhávamos em ter um jet pela quantidade de água na seca. O rio baixa muito, e o jet precisa de pouca água para navegar”, explica Moacir.

Cara, coragem e planejamento

Moacir conta que “mesmo sem conhecer nada”, ele e a equipe do Araguaia Jet entraram em contato com outros amantes da navegação, buscando meios de concretizar a travessia. Assim, conseguiram programar uma logística para a expedição que envolvia, também, a ida dos jets para Rio Branco, em Roraima.

As embarcações andaram durante uma semana de balsa, de Barra do Garças a Roraima, com uma parada em Santarém (PA). Os aventureiros, por sua vez, pegaram um voo em Brasília — cerca de 600 km de Barra do Garças –, rumo à Boa Vista, com duração aproximada de 3h30.

Para viabilizar essas e outras despesas, o grupo conta com uma poupança, em que cada integrante deposita um valor mensal, utilizado futuramente para a realização de viagens como essa — em que o saldo começou a ser contabilizado cerca de um ano e meio antes da expedição.

Para se ter uma ideia, uma travessia como a de Boa Vista a Barra do Garças, com cerca de 6 mil quilômetros, gerou um gasto de aproximadamente R$ 17 mil só em combustível, com cerca de 2,5 mil litros usados. Desse total, a gasolina “mais cara foi $ 8 e a mais barata $ 5,80”, como revela Moacir.

“Sabíamos que seria possível chegar na nossa cidade pelos rios que passaríamos, mas havia uma complicação muito grande por estarmos em um período de estiagem, agravadas pelo momento de queimadas que passa o Brasil, que fazem com que a água do rio diminua”, explica.

Gente da água

Já na primeira etapa do percurso, Moacir e o grupo se surpreenderam com o estado de Roraima. “A mídia mostra uma Roraima que parece ter uma dificuldade muito grande, mas é uma cidade planejada, organizada, que merecia todos os olhares — até náutico”, opina.

“Tenho certeza de que é uma cidade muito gostosa de se viver. Tem boas águas, um plano diretor. Me impressionou muito”, destaca.

A equipe do Araguaia Jet tinha o conhecimento de que na região norte, ponto de partida, “tudo é feito pela água”, o que facilitaria o acesso a recursos. No trajeto, inclusive, passou pela cidade de Afuá, na Ilha de Marajó, onde tudo é feito de bicicleta, já que o município é construído em cima de palafitas, devido às cheias do rio Amazonas.

A data escolhida para a travessia driblou o período de temporadas, assim, o grupo não encontrou dificuldades para se estabelecer em pousadas. Muitas pessoas, inclusive, ofereceram lugares para que os ‘jeteiros’ dormissem à beira do rio.

“A maioria dos restaurantes ficavam em flutuantes no rio. A logística deles está toda ligada a isso, então não tivemos dificuldades. Ainda assim, levávamos alimentos no jet e sacos de dormir. Estávamos preparados”, garantiu.

Moacir conta que “dos 26 dias, pode ter certeza de que em 24 comemos peixe”. Dentre tantos rios percorridos, a equipe pôde observar uma ampla diversidade desses animais, de espécies como pirarara e piraíba. Além deles, os búfalos se destacaram no horizonte. Até porque o norte do país concentra 62% do rebanho nacional da espécie.

No caminho, uma pausa para observar a cultura local, como as balsas carregadas de gado. Moacir explica que “os animais eram retirados da fazenda quando a água do rio subia, e retornavam depois, quando a maré baixava”.

Os jeteiros também passaram perto do povo indígena Yanomami e sentiram medo do ataque de piratas e da linha de tráfico de drogas que circula pela região, muito próxima à fronteira com a Venezuela. Bem por isso, estavam respaldados pela Marinha do Brasil, que foi devidamente comunicada sobre a expedição.

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