É de domínio público que a administração do já falecido governador Anchieta Júnior foi acusada do maior escândalo fundiário de Roraima. Mas a opinião pública desconhece que o atual governo que está no comando do Estado não só fechou os olhos para as irregularidades como continua se beneficiando dele. Trocaram apenas o cachorro e as pulgas, mas a coleira da indefinição fundiária que trava o Estado é a mesma, reforçada pela desfaçatez de quem prometeu fazer diferente e combater as irregularidades.
Já está nas mãos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), conclusa para julgamento, um pedido de providência que poderá resultar na maior faxina fundiária de todos os tempos. Não é à toa que houve uma grande mobilização em Brasília para tentar empurrar, no âmago da Medida Provisória 901/19, cujo relatório pode ser votado hoje, na Câmara Federal, a “indústria da autodeclaração”, em que bastaria o detentor da posse do imóvel rural declarar a área sob seu domínio para dar início à titulação. Não colou.
No documento formalizado junto ao CNJ, foi feito o pedido para que sejam canceladas todas as matrículas nos cartórios de registros de imóveis dos títulos definitivos emitidos pelo Instituto de Terras e Colonização do Estado de Roraima) que não atendem à legislação e os que possuem fortes evidências de fraude ou falsificação, em especial há um caso em que o governador Antonio Denarium é o proprietário do imóvel rural.
São atingidos por esse pedido os títulos emitidos sem o Assentamento Prévio do Conselho de Defesa Nacional (CDN). Também áreas cujos títulos são flagrantemente falsos por não terem processo no Iteraima, com assinaturas falsificadas. Existem também os fraudulentos, cujos títulos foram emitidos com a assinatura do governador e do presidente do Iteraima, mas que não têm qualquer processo administrativo no órgão fundiário. Ou seja, continua uma verdadeira farra de irregularidades fundiárias.
O caso em que envolve o nome do governador é de uma área na gleba Murupu, zona rural de Boa Vista, no Igarapé Carrapato, ao lado da área Pedra Pintada e Said Salomão. A área de16 hectares, avaliada em R$6 milhões, adquirida por Denarium, está irregularmente titulada. O título está registrado no cartório, mas consta como cancelado no Iteraima. Como governador e saber das irregularidades cometidas no passado, ele se calou e não tomou providências.
São vários os casos de irregularidades listados no documento entregues ao CNJ, os quais são de conhecimento do Iteraima e do próprio governador, que foi alertado e não tomou providências. Se houver interesse numa investigação fundiária profunda, irão descobrir quem é o maior latifundiário de Roraima. Denúncias apontam para um único dono a posse de imensas áreas nos municípios de Iracema (35 mil hectares) e Mucajaí, na região de Campos Novos (25 mil hectares), além de vários outras áreas em nome de terceiros. Um verdadeiro escândalo.
Também é de conhecimento nos bastidores agrários o caso de um funcionário de escritório imobiliário que trabalha pela manhã no órgão fundiário só para comandar o andamento da “regularização” dessas áreas, as mesmas que são oferecidas a empresários de fora, que são atraídos pela promessa de áreas a preços mais baixos e apoio governamental para regularização fundiária e apoio nos investimentos.
É por isso que a questão fundiária continua sendo um entrave em Roraima. Porque não há interesse em regularizar nada, enquanto verdadeiros latifúndios são mantidos sob falsificação ou fraude. Nessa lista das irregularidades estão alta autoridades de todos (ou quase todos) os poderes constituídos. E o povo fica sendo engabelado. O fio de esperança está no CNJ, que enviou seus representantes ao Estado e acabaram se deparando, sem querer, diante do caso da manutenção do pior escândalo fundiário de todos os tempos.
*Colunista