Há cerca de uma semana, a prefeita Teresa Surita (MDB) foi para o seu Twitter reclamar: “Meu sonho é abrir os sites de notícias e ler alguma coisa boa”. Esse resmungo tem uma tradução pela lógica dela. Na verdade, na semana em que houve muitas críticas à “indústria da multa”, ela queria dizer exatamente isso: “Meu sonho é ver a imprensa local sem fazer críticas”. Tal sonho povoa a cabeça da maior parte dos políticos, senão de todos.
Do PT de Lula ao PSL de Bolsonaro, todos os governos apresentaram planos para combater ou impor algum tipo de regulamento à imprensa livre. Em 2017, quando ainda pensava que seria candidato, Lula afirmou que iria ganhar e fazer a regulamentação da imprensa (veja aqui). Ele tentou fazer isso quando foi presidente, mas não conseguiu graças à mobilização da sociedade organizada.
Bolsonaro se elegeu fazendo seguidos ataques à imprensa, boa parte deles valendo-se de notícias falsas disseminadas nas redes sociais, as chamadas fake news. Eleito, os ataques continuaram, um deles mereceu até nota pública da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), cuja parte do texto afirmou: “Quando um governante mobiliza parte significativa da população para agredir jornalistas e veículos, abala um dos pilares da democracia, a existência de uma imprensa livre e crítica”. Veja aqui.
Teresa Surita não tem coragem de dizer abertamente o que ela pensa sobre a imprensa e a liberdade de expressão, porque seu comportamento é de jogar flores para a opinião pública e agir na surdina nos bastidores. O fato é que ela se vale dos sites e veículos de comunicação que a hipotecam sustentação para atacar seus adversários políticos e publicar maravilhas sobre sua administração. Assim ela não suja as mãos.
Isso sem falar da rede de proteção que ela mantém nas redes sociais. Inclusive seu perfil no Facebook tem mais de 1,3 milhão de seguidores, um caso de sucesso no país, considerando que muitos artistas famosos não conseguem chegar a tal façanha, como Teresa alcançou, uma prefeita de uma Capital que não chega a 500 mil habitantes, isolada no extremo Norte do Brasil.
Valendo lembrar que o Facebook não é a rede social preferida da prefeita. Teresa prefere o Twitter, eleito por ela como preferido e a ferramenta escolhida para interagir com os internautas de Boa Vista. No Twitter, ela só tem 29.901 seguidores, o que parece um número que mais se aproxima do real, diante do Facebook e considerando que ela bloqueia quem a critica (ressaltando que eu sou um dos internautas bloqueados).
Esse é o resumo do que a prefeita pensa da imprensa tradicional, dos sites de notícia e das redes sociais. Ela sonha ver uma sociedade sem críticas e uma imprensa omissa, bem como uma rede social cujos algorítimos estejam a seu favor. Ela é tão fissurada nisso que mandou construir um Facebook com um extraordinário número de seguidores (leia-se: um exército de fakes prontos para elogiá-la e defendê-la). Confia tanto nesse exército que deixa seu perfil ser administrado por assessores, enquanto ela vai pessoalmente para o Twitter, rede social da qual é viciada.
E assim são os políticos, completamente avessos a críticas nas redes sociais e a uma imprensa livre. É por isso que a sociedade não pode abrir mão de seu senso crítico, como muitos político querem e planejam, porque os maus políticos só se sentem pressionados quando sabem que estão sendo monitorados, seja pelo cidadão, por meio das redes sociais, ou pela imprensa livre, que está pronta para denunciar desmandos e apontar os erros. Não se deixe enganar.
*Colunista, idealizador do site www.roraimadefato.com.br