Chegou a sua vez na fila da vacina contra a covid-19, a foto da carteira de vacinação já foi postada e ninguém pode negar que este é um evento que merece ser celebrado com um brinde à sua saúde. Mas aí vem a dúvida: será que bebidas alcoólicas como cerveja ou vinho poderiam “cortar” o efeito desse imunizante tão esperado?
Não é de hoje que os cientistas advertem sobre os prejuízos do consumo exagerado do álcool para o nosso organismo, já que ele é capaz de afetar órgãos como o cérebro, coração, fígado e pâncreas, além de estar relacionado a vários tipos de câncer como cabeça e pescoço, esôfago, mama, entre outros.
O sistema de defesa do corpo não fica atrás. Ele também se ressente, deixando as pessoas mais suscetíveis a doenças. Um estudo publicado pela revista médica Alcohol Research concluiu que aqueles que não têm limite na hora de beber também possuem risco aumentado para doenças como a pneumonia e a insuficiência respiratória, ambas relacionadas à covid-19.
Sabe-se ainda que o álcool pode “retardar” a velocidade da resposta contra infecções por até 24 horas após sua ingestão, e isso resulta em maiores chances de complicações e dificuldade na recuperação em caso de adoecimento. Mas a literatura especializada é clara: todos esses dados dizem respeito apenas ao abuso, excesso ou uso crônico de bebidas alcoólicas.
O que diz a bula
A interação de fármacos com o álcool pode estar presente nas bulas de alguns medicamentos. No caso das vacinas hoje disponíveis no país —AstraZeneca, CoronaVac, Janssen e Pfizer— não existe qualquer indicação expressa desse possível efeito, e nem mesmo a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) emitiu orientação nesse sentido.
De acordo com Flávia Bravo, diretora da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações), a falta dessa advertência se justifica com o fato de que, quando os estudos de segurança e eficácia de vacinas estão sendo realizados, o uso moderado de álcool pode não ser incluído no critério de exclusão de participantes. Afinal, os pesquisadores sabem que beber de vez em quando faz parte da vida social.
Bravo afirma que o consumo esporádico e racional dessa substância não acarreta alteração crônica no organismo capaz de influenciar a ação da vacina. “Não existe evidência mostrando que o álcool antes ou após a imunização possa interferir na sua resposta final”, diz. “O mesmo não se pode dizer dos usos crônico ou exagerado, que afetam não só os sistemas orgânicos como atrapalham a resposta imunológica”, conclui.
Aliás, a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), encarregada da produção da AstraZeneca, em seu site (atualizado em junho de 2021), ratifica tal entendimento.
Beba com moderação
Na opinião de Emanuel Maltempi de Souza, coordenador do Comitê de Combate à Covid da UFPR, como cada pessoa responde de forma diferente às bebidas alcoólicas —há os geneticamente mais sensíveis, o ideal é que a celebração seja equilibrada: “Dá para festejar, sim, mas de forma moderada. A ordem é se limitar a uma latinha de cerveja (350 ml) ou a uma taça de vinho (150 ml)”.
Fontes: Flávia Bravo, diretora da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações); Emanuel Maltempi de Souza, professor do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular da UFPR (Universidade Federal do Paraná) e coordenador do Comitê de Combate à Covid da mesma instituição. É também integrante do projeto de pesquisa de uma nova tecnologia para o desenvolvimento de um imunizante contra a enfermidade —ainda na sua fase pré-clínica).
Referências: Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária); Instituto Butantan; FDA (Food and Drugs Administration); CDC (Centers for Disease Control and Prevention); Simet SM, Sisson JH. Alcohol’s Effects on Lung Health and Immunity. Alcohol Res. 2015;37(2):199-208; Díaz LE, Montero A, González-Gross M, Vallejo AI, Romeo J, Marcos A. Influence of alcohol consumption on immunological status: a review. Eur J Clin Nutr. 2002 Aug;56 Suppl 3:S50-3. doi: 10.1038/sj.ejcn.1601486. PMID: 12142963.