Denúncias de irregularidades em contratos milionários na Prefeitura têm sido ignoradas (Imagem: Divulgação)

Já que o Ministério Público de Roraima (MPRR) tem sido acometido por um surto de empenho na fiscalização do bem público, restam questionamentos sobre seguidas denúncias para as quais o órgão fiscalizador tem fechado os olhos. Um dos fatos gravíssimos foi a contundente denúncia apresentada pelo então secretário demissionário de Saúde, Ailton Wanderley, que em abril passado apontou detalhamento sobre as evidências de corrupção sistêmica naquele setor.


Diante dos fatos que alarmaram as pessoas já indignadas pelo caos na saúde (e piorada pelo êxodo venezuelano), quieto ficou e em silêncio permaneceu o MPRR, deixando a população em um dos mais absurdos e flagrantes casos não só de corrupção, como também de violação à Constituição Federal, que determina saúde gratuita e de boa qualidade ao cidadão.

Situação tão absurda que, quatro meses depois, sem que tenha havido qualquer manifestação ministerial, os próprios médicos do Hospital Materno Infantil Nossa Senhora de Nazareth chegaram a pedir socorro devido ao caos instalados por lá diante das mazelas no setor. Mas nem isso sensibilizou o órgão ministerial a agir, como fez no passado ao investigar imediatamente, em 1996, as denúncias das mortes de bebês no berçário da maternidade.

Não menos graves são as seguidas denúncias de irregularidades feitas sobre os contratos milionários realizados pela Prefeitura de Boa Vista. As evidências são solenemente ignoradas pelo MP, como se a Prefeitura fosse um templo inviolável, em um Olimpo inatingível, a ponto de os casos sequer merecerem um procedimento preliminar. Da lista de denúncias envolvendo os gastos municipais, basta citar os que registram alta soma de recursos públicos de fazer inveja a uma Capital de um Estado rico.

Um desses casos refere-se ao projeto de mobilidade urbana, que consumiu R$65 milhões sem que a população saiba onde essa dinheirama foi gasta.  O segredo sobre esses gastos chega ao absurdo de a prefeita Teresa Surita (MDB) se negar a fornecer dados via Lei de Acesso à Informação ou mesmo por meio de decisão judicial. E assim não se sabe que obras foram realizadas, os detalhamentos e seus respectivos valores.


Diante da cegueira do Ministério Público, outra obra milionária, a construção da nova orla onde ficava o Beiral, que vai custar R$134 milhões, segue o mesmo rito de licitações suspeitas, inclusive com um dos lotes licitados tendo sido questionado na Justiça. A obra mal começou e o Lote II, no valor de R$52,6 milhões, já está em seu segundo aditivo, inflando ainda mais os valores milionários pagos com o dinheiro do contribuinte. Tudo isso ao largo das fiscalizações ministeriais.


Outro rumoroso caso, o do contrato da empresa paulista Sanepav, que em cinco anos de mandatos de Teresa Surita já abocanhou R$400 milhões para juntar lixo na cidade, tem até um dossiê entregue às autoridades. Mas, novamente, o MP fingiu que não é com ele, ignorando todos os fortes indícios de irregularidades. Existem ainda os contratos milionários com outra empresa paulista que pertence ao mesmo dono, a Beta Clean, o que chegaríamos a uma grande fortuna paga pela Prefeitura apenas nesses contratos.


Excluindo os casos de corrupção citados pelo então secretário de Saúde, pasta que tem um orçamento anual acima de R$600 milhões, os demais casos referem-se a denúncias sobre gastos da administração da prefeita Teresa Surita que chegam a quase R$600 milhões sob suspeita de irregularidades, conforme as denúncias apresentadas. É quase o mesmo valor anual gasto pela saúde pública estadual.

Apesar de todos os casos citados terem vindo à tona com fortes indícios de irregularidades, a única providência que se tem notícia, até o momento, é da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Saúde criada pela Assembleia Legislativa, uma genérica vistoria às unidades de saúde feita pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) e da tentativa de criação da CPI do Lixo, a qual foi enterrada solenemente pelos aliados da prefeita na Câmara de Vereadores.

Nenhuma providência por parte do Ministério Público foi registrada ou cogitada, que diante desse surto fiscalizador tem motivos de sobra ao menos para uma urgente inspeção na maternidade pública, entregue ao caos e ao desespero médico, onde muitos bebês estão morrendo. Quem sabe, aproveitando o momento propício, o órgão ministerial acorde de seu sono profundo quando se trata de averiguar os contratos milionários da Prefeitura de Boa Vista sob suspeita de irregularidades. Quem sabe…

*Colunista

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